quinta-feira, 28 de julho de 2011

De “culpas” progressistas

Nei Alberto Pies,
Professor e Ativista de Direitos Humanos
Se não há uma boa base educativa, uma boa metodologia, que some aos conhecimentos que já existem, não haverá mudança, não haverá educação integral, será impossível ter em conta o ser humano em sua totalidade” (César Muñoz Jimenez, em entrevista a ZH 03/04/11)

Estamos na aurora de um tempo em que, no afã de indicar culpados para os problemas da sociedade, alguns são tentados a usar argumentos simplificados e pouco consistentes, maculando as verdadeiras razões para explicar a realidade como ela é. A velocidade dos avanços tecnológicos e científicos e nem a volta aos “velhos métodos” servem de bases de resolução dos nossos problemas humanos atuais. Os mais sóbrios e experientes já aprenderam que para problemas complexos, como da educação brasileira, não existem soluções simples e de fácil aplicação, ou de aplicação generalizada.

O objeto da educação são as pessoas, por isso a complexidade de tratar, ao mesmo tempo, habilidades como a leitura e compreensão dos contextos e a construção de conceitos com a necessidade da integração dos sujeitos a partir da família, da escola e da comunidade. Este processo é sempre lento, gradual, com princípios que conduzam à realização humana, o que ultrapassa a dimensão mecânica do processo de ensino-aprendizagem. 
 
Os avanços das idéias progressistas no Brasil estão associados aos processos de conquista da liberdade, da organização e da democracia, a partir da Constituição Federal de 1988. Neste contexto, estão imbricados as inúmeras conquistas sociais que se materializaram em políticas públicas de saúde, educação, trabalho, moradia, assistência social, proteção às crianças e adolescentes, de inclusão, etc. Desta “caldeira política cultural” emergiram as teorias e compreensões progressistas da educação que foram afirmando a necessidade de construirmos os próprios sujeitos do conhecimento. Igualmente verdadeiro, podendo-se comprovar, suas proposições estão imprimindo algumas mudanças na gestão da educação, o que não quer dizer que resolveram todos os seus problemas, o que também não era a sua intenção.

As “maiores culpas” que podemos atribuir aos progressistas é que estes conquistaram, junto com o povo brasileiro, a garantia do acesso às escolas públicas. Finalmente, a escola passa a ser um lugar também considerado pelo povo, pela maioria pobre e desvalida, pelos filhos dos trabalhadores. Outra questão, igualmente nobre de “culpa”, é a contundente teimosia de associar “educação pública com qualidade”: pedagógica, de gestão e de conhecimento. Mas o Estado fez os investimentos públicos necessários para dar conta das novas demandas criadas, seja na qualificação dos espaços físicos, seja em investimentos na gestão escolar e na qualificação profissional dos docentes? Tratou a educação com prioridade?

Nossa escola pública, que se inspira sim em ideais progressistas, é uma escola que seguiu um modelo de educação centrada na lógica da abstração, da memória, do intelecto, sem considerar, de forma consistente, a realidade concreta em que vivem os sujeitos do conhecimento. Sem perceber a gravidade, deixou de trabalhar as dimensões cognitivas de caráter prático como as artes, as técnicas agrícolas, o trabalho com madeira, as atividades domésticas e de culinária, as hortas escolares. Foi tendo dificuldades de incorporar os elementos das novas gerações como a fantasia, a criatividade e a imaginação. Estas sim, razões para uma revisão de propósitos.

O maior risco, neste contexto, é a educação virar mais um produto de consumo, não um serviço e uma política de inclusão, com cidadania. Os progressistas desejam uma educação contextualizada, acreditando que a vida pode ser melhor a partir de oportunidades, do conhecimento e da cidadania ativa. A formação integral, sua bandeira, compreende o ser humano em sua totalidade, investiga as reais necessidades dos sujeitos para então intervir pedagogicamente, desencadeando os processos de aprendizagem.

quinta-feira, 21 de julho de 2011

De Religiões e Planeta: breves notas

Nei Alberto Pies, professor e ativista de direitos humanos.

"Deus é Amor. Para nos ensinar a amar, ele inspirou o aparecimento das religiões. Deus mesmo não tem religião, mas pode ser encontrado através de todas elas" (Frei Betto)

O objetivo das religiões ou tradições religiosas é possibilitar ao ser humano a construção de um sentido de vida. O Ensino Religioso trabalha o diálogo inter-religioso, com o objetivo de conhecer e compreender o conhecimento historicamente acumulado pelas diferentes tradições religiosas. Quando este conhecimento é estudado e aprendido, quebram-se muitos dos nossos preconceitos. A gente aumenta as possibilidades de compreensão da religiosidade dos outros quando conhecemos os fundamentos e razões de sua religiosidade.

  É possível dizer que não há como trabalhar o Ensino Religioso nas escolas sem falar da dimensão do amor, um dos valores mais sagrados e exaltados pelas religiões. O amor é compreendido na dimensão do cuidado: consigo mesmo, com os outros e com o planeta (demais seres vivos). O amor, valor universal pregado pelas religiões, é a base da preservação da vida e pilar na busca da felicidade e dignidade humanas. Propõe, ainda, a superação do individualismo exacerbado.

Se existem em torno de 65 mil religiões no mundo e, aproximadamente, 5 mil diferentes denominações religiosas no Brasil, é porque em nosso momento histórico vivemos carentes de espiritualidade e de respostas existenciais. Estamos falando de um mundo que evoluiu extraordinariamente na compreensão dos fenômenos da natureza e na produção de altas tecnologias que buscam facilitar a vida dos seres humanos, mas este mesmo mundo não foi capaz de possibilitar respostas que levem à plena felicidade e realização do ser humano.

Nosso mundo é feito de grandes contradições. Ao mesmo tempo em que festejamos os avanços tecnológicos na produção de alimentos, por exemplo, ainda há muita fome no mundo e no Brasil. Enquanto nosso PIB cresce, permanece a concentração de nossa renda. Enquanto ainda ocorre o abandono do campo, acontece a ocupação desordenada e perigosa nas periferias das grandes cidades. Enquanto buscamos paz, ainda muitos promovem a guerra em nome de seus interesses mesquinhos e individualistas. Enquanto nos orgulhamos com projetos de irrigação, poluímos nossas fontes de água potável, indispensáveis para a nossa sobrevivência. Tudo isto porque nos orientamos pelos valores individualistas e egoístas, que não nos permitem ocupar a terra e o planeta de forma racional e sustentável. Tudo isto porque produzimos tecnologias avançadas com a intenção de tão somente alimentarmos a ideologia de nosso consumo, ideologia esta que tem sido a base de nosso padrão de convivência e civilização.

É impressionante como já temos muitas informações sobre como deveríamos agir diante da vida e do planeta. O que temos como informação, deve agora traduzir-se em conhecimento. Este é o papel da escola e da educação: dar sentido útil e prático àquilo que todos nós já sabemos e aprendemos sobre a sustentabilidade, o meio ambiente, o bem-estar social, a biodiversidade, os demais seres vivos.

Há que se re-inventar nosso modo de viver e agir no mundo. Fala-se de uma Ética do Cuidado, onde as novas relações, hábitos e a mudança de nossas mentalidades façam a escolha de preservar a vida. É chegada a hora da evolução de nossa consciência. As futuras e a atual geração têm de ser beneficiadas por esta escolha. As religiões podem e devem nos orientar para que, em vida, possamos usufruir das melhores condições de vida e dignidade, em harmonia com o nosso ambiente.

Comece você mesmo, agora, a tomar pequenas atitudes que resultem na preservação da vida no planeta. Você faz a diferença! E esta diferença deve amenizar o impacto da ocupação que você faz da natureza, a partir dos seus recursos naturais. Não esqueça que as crenças, a vida dos seres vivos e as boas atitudes são o que de mais sagrado podemos dispor para o mundo.

quinta-feira, 14 de julho de 2011

TEMATIZANDO A HISTÓRIA

Jéferson Dantas1


A história brasileira recente está longe de ser totalmente revelada. A tentativa por parte de organizações defensoras dos direitos humanos em se retomar as buscas dos corpos dos/a desaparecidos/as políticos na guerrilha do Araguaia (década de 1970), assim como a abertura de documentos sigilosos que comprovam o extermínio dos guerrilheiros por setores das Forças Armadas, representa ainda um vespeiro que muitos não querem trazer à tona. Os/as cientistas sociais são impedidos/as de ter acesso aos ‘documentos confidenciais’ produzidos pelas agências de repressão durante a ditadura militar em nosso país. Contudo, a história não pode ser negada às gerações que não vivenciaram os anos de silenciamento político e de mordaças compulsórias.

Nesta direção, uma das maneiras do conhecimento histórico se tornar atraente para crianças e jovens escolarizados/as é a tematização da história recente do Brasil e da América Latina, através de materiais didáticos que não privilegiem uma perspectiva historiográfica eurocêntrica e meramente conteudista. As questões do presente devem ser apontadas desde cedo para as crianças em processos de escolarização e, posteriormente, – com os cuidados de linguagem e categorias de análise empregadas – devidamente relacionadas com as dimensões históricas mais afastadas no tempo e no espaço. Os recortes temáticos são assim fundamentais para que um debate não se esgote em apenas uma aula ou uma atividade em grupo. O tema ‘ditadura militar’, por exemplo, é um assunto que demandaria muita pesquisa, busca por evidências históricas, análise de conjuntura, mapeamento das guerrilhas urbanas e rurais, aparelhamento do Estado a partir de agências de tortura, etc..

Categorias ou conceitos vagos, além do pouco dinamismo didático nos bancos escolares são muito recorrentes nas escolas brasileiras. Ainda mais quando determinadas instituições de ensino estão mais preocupadas em ‘formar’ fazedores de provas do que, propriamente, sujeitos históricos intervenientes. As permanências históricas estão mais vivas do que nunca, através de milícias particulares que assassinam pequenos agricultores e lideranças rurais a mando de latifundiários; do patrimonialismo e do clientelismo nos setores de serviços públicos; e do analfabetismo pleno e funcional alarmantes. Negar o acesso às fontes históricas – matéria-prima dos/as pesquisadores/as – também é uma forma de silenciar as falas dos dissensos e a constituição de novos espaços de disputa. 
 
1 Historiador e doutorando em Educação (UFSC). E-mail: clioinsone@gmail.com

quinta-feira, 7 de julho de 2011

Política com “P” maiúsculo vinda de Brasília

Ernando Cassemiro Gonçalves

Transmigrando saberes necessários para a (de) formação dos jovens contemporâneos na capacidade de atribuir competências, habilidades e criticidades filosóficas, demonstramos a importância de cogitarmos como podemos executar atividades cotidianas de maneira coesa, bem fundamentadas, que apresente uma solução sustentável e ainda alcance a interdisciplinaridade. Uma das alternativas encontradas, foi oportunizarmos a dilatação do tempo útil de algum tipo de material, não orgânico, que já tenha sido utilizado anteriormente. No caso desta atividade, o jornal. 
 
Tendo como matéria prima o jornal impresso, os alunos devem mostrar por si só, o ser humano como um ser que interage (PAS – UnB). O processo de interação dos entes, acontece pelo desnivelamento do já nivelado e velado conceito de Política. Portanto, os alunos do terceiro ano do Ensino Médio do Instituto Educacional Santo Elias e do Instituto São José de Brasília, tem a primazia como “privilégio” de viverem, respirarem e questionarem a encenação da performance dos atores que estão atuando no palco da política regional e nacional. Dessa forma, a inserção do vir a ser cidadão e o desenvolvimento das articulações políticas, acontecem desde a mais pueril das idades candangas
 
A utilização do jornal para criar, recriar e dimensionar a definição do conceito de política através de uma escultura perpassa pelas mãos dos educandos como se fosse a primeira vez que se tratasse desse termo. A transformação do pensamento abstrato em pensamento concreto nos remete exatamente ao plano cartográfico do despertar da plenitude criativa para elucidar a barreira do inatingível sobre a localização cartesiana do que vem a ser uma política atingível. O jovem possui em suas mãos a ferramenta principal da informação que o deforma. Agora, ele tem a chance de transformar sua deformação em formação. Reinventando, criando e principalmente conduzindo sua historicidade, deixando de ser objeto social passando a atuar como sujeito transformador de seu meio social. A fôrma da ação do que é política sendo expurgada por ações pragmáticas decantam uma nova visão axiológica daquele que externou seu sentimento político através de sua ação racional e apreciada pela sensação emocional.

A alfabetização e a conscientização da cidadania são questões que sempre permearam a educação no Brasil, menos claro que no período ditadura militar. Trazendo inquietações governamentais para dentro da sala de aula, faremos uma construção não fictícia da realidade estatal que se encontra nosso país. A formação de uma consciência política nos jovens que estão sendo engolidos por uma onda esmagadora de informações, faz com que tenhamos esperança de um público que seja privado de alienação global.

O grupo de alunos formados pela Camila, Natalia, Pedro e Sabrina dialogaram sobre Política “quando pensamos em política, a primeira coisa que vem na nossa cabeça é a grande corrupção existente, por exemplo, no Brasil, ou talvez as eleições presidenciais. Outras vezes, nem sequer `ligamos` para a política, alegando ignorância, fatalismo, conformação. Mas política não é somente tal corrupção e parlamentos; é através dela que pode-se melhorar a educação, saúde, economia, esportes... É ela que diz respeito à nossa vida privada e pública. Assim, todo povo com sua cultura, tem seu modo de fazer política, seja por monarquias ou `democracias` . A política também está diretamente ligada ao poder: damos certo poder aos políticos governantes para que possam governar, atender nossas necessidades e vontades. Porém, a corrupção é um fator que dificulta o atendimento das necessidades dos cidadãos – que devem exercer seus deveres e exigir seus direitos”.

Já o grupo da Amanda, Esdras, Gabriel e Lucas fizeram uma analogia da política a um banquinho “Comparamos a definição de política com um banquinho de três pernas. Para que a sociedade se ‘sustente’, são necessárias três relações principais: Força, Poder e Cidadania, onde cada uma deve desempenhar seu papel para a manutenção das relações sociais”.

Dessa forma, a contribuição dos alunos demonstra a percepção assimilativa da participação da sociedade educativa no âmbito regional e até nacional, se espalhando como rizomas, em discussões iniciadas nos grupos ganhando ênfase por toda sala de aula e chegando as redes de comunicações sociais virtuais. As assertivas a favor e as opiniões contrárias governamentais são levadas a sério pelos educandos. A questão a priori de se fazer perceber que os jovens não são o futuro da nação e sim o presente, são levadas a sério. Por ironia não socrática, mas pela dialética platônica, quando relatamos que o jovem de hoje é o futuro da nação, estamos apenas dizendo que hoje, eles não são nada, não têm participação alguma são apenas meros objetos que num futuro consumido por Cronos, nuca chegará. Então, os sujeitos fazedores da história alimentando-se culturalmente de politicagens, tentam engendrar condições empíricas necessárias para metamorfosearem seus aspectos cognitivos e assertivos sobre o que realmente vem ser Política.