quinta-feira, 31 de maio de 2012

Razões que justificam ser a verdade um Bem





Por Ivo José Triches

      A intenção deste escrito é facultar uma reflexão capaz de lhe acrescentar novos conhecimentos.
Há outra intenção, que você se sinta motivado (a) em partilhar este escrito com outras pessoas, afim de que elas possam se beneficiar do mesmo, uma vez que o fim último é contribuir para que cada um seja o fundamento do seu próprio fundamento moral.

1- O que é a verdade?

Esse é um questionamento até hoje feito por muitos filósofos, no entanto, não existe consenso, o conceito de verdade estabelecido por Aristóteles (384 – 322 a.C.) é até hoje o mais aceito. E qual é? A ideia de que a verdade é a concordância daquilo que há no meu intelecto com o que existe na realidade.
Só há uma coisa que para em pé. O quê? A verdade.
O provérbio veritas filia temporis (a verdade é filho do tempo) vem ao encontro da minha afirmação acima. O que implica em dizer que se você foi ou está sendo acusado (a) por algo que você não fez, não sofra.  Um dia a verdade aparecerá.
Outro provérbio significativo: in vinoveritas(no vinho a verdade). Dê bebida a uma pessoa e você a conhecerá. Ela poderá revelar suas fissuras morais ou não. O que há de mais escondido poderá vir à luz...

2 – A relação entre verdade e sinceridade

Na obra Convite à Filosofia, cuja autora é Marilena Chauí, o conceito de verdade é apresentado a partir de sua etimologia. Lethesna mitologia grega era um rio onde as pessoas necessitavam mergulhar para esquecer suas almas passadas. A letra “a” em muitas palavras de origem grega designa a ideia de negação. Por exemplo: tomo = divisão. Átomo = não divisível. Hora, se lethes é esquecer, alethéiao que é? Aquilo que não se pode esquecer. E o que é que não se pode esquecer? A verdade. Razão pela qual Chauí nos mostra que alethéia (a verdade em grego) significa desnudar, por a nu...
Em 1986, Paulo Freire escrevia artigos na Folha de São Paulo. Não me recordo qual era o dia da semana. Na ocasião eu estudava no terceiro ano do antigo Segundo Grau. Estava no Seminário em Ponta Grossa aqui no Paraná. Num daqueles artigos ele escreveu sobre a diferença entre senso comum e consciência filosófica. Fez uma analogia que eu nunca mais esqueci. Hoje eu entendo melhor. Ele estava escrevendo sobre o que é verdade. E qual foi a analogia feita?
Paulo Freire disse que a pessoa que vive a partir do senso comum é semelhante a alguém que está dentro de um fusca no inverno. Imagine que seja um dia de inverno com muita neblina. A pessoa que está no fusca consegue enxergar o que há lá fora, mas vê as coisas de forma confusa. Ela se dá conta que há uma pessoa a sua frente, só que não consegue distinguir se é homem ou mulher, por exemplo.  À medida que o sol começa aquecer o clima o que ocorre com a neblina? Ela se dissipa. Pronto, a pessoa que está dentro do fusca começa a ver o mundo lá fora tal como ele é.
Algo semelhante ocorre com a pessoa que estuda. Ela começa a tirar a “neblina” da frente dos seus olhos. Chegará àquilo que Paulo Freire convencionou chamar de consciência filosófica. Agora vamos à etimologia da palavra sinceridade.
Os soldados romanos quando voltavam das batalhas que travavam com outros povos, eram recebidos com festa pelos habitantes que ficavam em Roma. Só que nessas batalhas muitos eram feridos. Em alguns, tais ferimentos era no rosto. O que eles faziam para ocultar os ferimentos? Passavam cera. Então com o tempo as pessoas começaram a perceber que a verdade aparecia. Por isso elas diziam: - sine cera (sem cera).
Pedir a alguém que seja sincero é pedir a esta pessoa que diga a verdade. Que tudo seja explicitado “sem cera”, sem máscara. Se muitas pessoas tirarem a “cera” que colocam todas as manhãs em sua face o que restará?
A imbricação entre verdade e sinceridade é evidente. Não há como separar esse dois conceitos no meu entendimento. Um ajuda a explicitar o outro. Agora voltemos ao que se propõe este escrito.

3 – As razões...

        Eu sempre me questionei o que Jesus quis nos dizer com a expressão: conheça a verdade é ela vos libertará. Ela nos liberta do quê? No meu entendimento do medo, da ignorância, da dominação dos outros, entre tantas outras coisas. Logo abaixo escreverei mais sobre isso.
        Aristóteles afirmou que a razão de ser da Filosofia é a busca do Bem. E o que é o Bem? Para mim aquilo que potencializa a minha existência. O que permite melhorar o meu endereço existencial. Aquilo que eleva o meu padrão-autogênico, como bem nos mostra Lúcio Packter, criador da Filosofia Clínica.
Uma das definições mais lindas que aprendi acerca da Filosofia é que ela é a busca amorosa da verdade, nunca a sua posse definitiva.
        A seguir, em forma de tópicos, buscarei evidenciar algumas das razões que justificam a importância de nos comprometermos com a busca contínua da verdade. Vamos a eles:
·      Buscar a verdade é nos afastarmos de muitos religiosos que defendem a “Teologia do cangaço”. E o que isso significa? Que existem líderes religiosos que são verdadeiros empresários da fé. Exploram o fenômeno religioso que há nos atores sociais impondo nesses o medo, a culpa. Assim conseguem mantê-los alienados, tornando-os presas fáceis dos seus interesses;
·      Se eu conheço a verdade no que diz respeito às leis, conseguirei sofrer menos. O primeiro benefício é que ao cumprir a lei não haverá penalidades;
·      Outra razão é que poderei fazer com que a lei aja ao meu favor. Um exemplo clássico que dificilmente esquecerei. Nos últimos cinco anos eu e meus sócios trabalhamos como escravos e ainda, de graça. Pagamos um valor exorbitante em impostos sem necessidade. Sabe por quê? Porque não conhecíamos a verdade. E qual era? De que poderíamos ter optado pelo Simples Nacional que é um regime tributário que beneficia alguns segmentos da economia. Hora, quem presta serviço para todos os níveis da Educação Básica pode optar por esse regime. Nós só tomamos ciência disso com todos os esclarecimentos necessários depois de vários anos “trabalhando como camelos”. Por isso a ignorância é a mãe de muitos sofrimentos;
·      Uma pessoa que busca estudar, de modo geral, sofre menos. Por diversos motivos, lógico. Creio que o principal deles é que o conhecimento alargará seu pensamento. Com isso se fortalecerá contra aqueles que se apropriam do edifício técnico-científico com a intenção de fazer com que os outros se tornem meros serviçais aos seus interesses. Vide empresários de fé, já explicitado acima, entre tantos outros;
·      Uma pessoa que se amansa em literatura e conquista no laço a ciência terá mais condições de acompanhar o desenvolvimento das forças produtivas.  O que de pronto lhe manterá ativa no mercado de trabalho. Do ponto de vista econômico, certamente, obterá muitas vantagens;
·      Aquele que não renuncia à busca da verdade, certamente, encontrará razões para não se esquecer de si mesmo;
Notoriamente que há outras razões, mas essas eu peço que sejam acrescentadas por ti. Digo isso para evidenciar queintenção é não dar esse assunto por encerrado.
Portanto, buscar de forma amorosa a verdade é estar cônscio que sua posse definitiva não será alcançada. Contudo, teremos a serenidade que ao nos aproximarmos dela, nossa segurança aumenta à medida que nos damos conta que estamos mais próximos do Bem.
A partir dessa busca, desejo que seus dias sejam suáveis.

quinta-feira, 24 de maio de 2012

QUEM SERÁ?




Profª. Valdirene Barbosa Ferreira*

Tudo parecia perfeito, quando surge algo estranho, um, tal de Dondon, era esquisito, magro, vestia-se com transparência, vivia com seu capuz, estava sempre pronto a servir bastava ser solicitado; não tinha hora marcada, a qualquer momento estava sempre à disposição de alguém.
Então, certo dia Dondon se encontrava muito triste. Como servia sempre, as pessoas o usavam para satisfazer os seus desejos. Quando queriam usavam-no para fazer o bem contar notícias maravilhosas, Dondon ficava feliz, ele se sentia maravilhado por fazer parte de grandes acontecimentos. Quando era usado para descrever um péssimo acontecimento, Dondon se sentia angustiado, humilhado, decepcionado com sua tarefa, pesada demais. E quando alguém utilizava para constranger o outro; para falar grosserias nem se fala, que situação...
Assim, Dondon levantava todos os dias imaginando quando ele iria se libertar como seria quando deixasse de servir ao homem. Se bem que teria muito a agradecer ao homem, pois era criação do homem. Ele existia por causa da necessidade do homem e durante sua curta permanência existencial, de tudo viveria um pouco. Mas vivia sonhando com o dia que não teria mais tinta, Dondon era uma caneta.
Mas uma vez, ficou decepcionado e contente ao mesmo tempo, pois descobriu que era recarregável seu companheiro de fazê-lo existir acabou, mas logo chegou um novo se sentindo o dono do pedaço.
No entanto Dondon continuava com o mesmo pensamento mesmo que trocassem  sua tinta ele continuaria sendo ele mesmo, o seu jeito e maneira de ser e existir continuaria, mesmo que em alguns momentos de sua vida houvesse algumas mudanças “sua personalidade” iria continuar sempre. Pois, às vezes, a mudança acontece exteriormente para reforçar o que já existi interiormente.

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* Qual impressão causei? Mas nele tentei brincar com as palavras e aí está..., um começo. Caso sirva e queira ilustrar fique a vontade.

Muito grata.

Profª Valdirene - Colégio Pro Campus - Teresina-PI

quinta-feira, 17 de maio de 2012

Parte II : A superação da relação entre AÇÃO POLÍTICA E PAIXÃO ERÓTICA: a alta política




Por José Luiz Ames e Ivo José Triches[1]

Inicialmente é importante destacar que a melhor compreensão deste texto dar-se-á se você ler o artigo anterior que publicamos com o seguinte título: ação política e paixão erótica: a política pequena.
Obs. Você encontrará esse texto neste espaço ou no blog: www.itecne.edu.br/ivo

1 – Retomando a essência do artigo anterior

As relações que ocorrem no âmbito da política pequena são semelhantes às que ocorrem com aquele ator social que age a partir da paixão erótica. Deixa-se dominar pelos seus instintos vegetativos. Deseja o poder com a mesma intensidade que deseja obter o prazer a qualquer custo como bem demonstramos no texto anterior.

Regra de ouro: o egoísmo é o axioma determinante da política pequena ao passo que o altruísmo é axioma da alta política.

2 – Algumas razões que possibilitam a superação da política pequena

A superação da estreita relação que há entre ação política e a paixão erótica ocorre quando um político age a partir da alta política.
O que é a alta política? A resposta desta questão já está implícita na regra de ouro acima. Um político que age a partir dessa perspectiva age pensando antes de tudo no bem da coletividade. Quando dizemos que um político é estadista, estamos nos referindo a alguém que pensa, antes de mais nada, no bem da sociedade.
Uma das coisas mais difíceis para um gestor público é conciliar o interesse coletivo com o interesse individual. Aquele que pretende agir a partir da perspectiva da alta política, na dúvida precisa tomar partido em favor da coletividade.

Regra de diamante: na alta política a construção do novo ocorre sem negar tudo o que os outros fizeram ou fazem.

Você que nos lê pode observar ao seu redor. O quê? É muito comum, quando chegam os pleitos eleitorais, a oposição procurar negar tudo o que já foi feito por parte daquele que está governando.
Dá a impressão de que a situação é do eixo do mal e que aqueles que querem assumir o poder são perfeitos. Ledo engano. Cometerão erros e acertos como os que já estão governando. Isso porque a imperfeição é condição humana. Muitos só sabem jogar pedras. Quando se tornam vitrine, cometerão erros ainda maiores. Notoriamente que nossa intenção aqui não é generalizar.

Regra de ouro: o criador nos fez diferentes para que juntos pudéssemos chegar mais próximos da perfeição.

Nós, de fato, podemos fazer algo ainda melhor do que já foi feito, mas para isso se desejarmos agir a partir da perspectiva da alta política necessitaremos ter a ética perto de nós. Esse é assunto a seguir.

3 – A ética como elemento constitutivo da alta política.

Refletir sobre o tema das relações entre ética e política não apenas é desafiador teoricamente, como urgente para a prática política no contexto atual. Um bom começo talvez possa ser perguntar-nos sobre aquilo que transforma uma ação qualquer em ação política. Podemos chamar de ação política a que cria o social. Quer dizer, é política a ação que assume como seu o ponto de vista da criação; que pretende moldar ou criar o universo que afeta não sua vida subjetiva, mas o da coletividade.
Há política quando nos fazemos sujeitos de uma realidade; isto é, quando não a tomamos por dada, ou por independente da ação humana, mas a concebemos como resultando dessa ação – e, melhor ainda, nos propomos a agir, moldando o mundo. Quando se define a ação como política, não tem mais sentido falar do lugar do governante ou de quem o contesta a fim de lhe ocupar a posição. O que importa é, muito antes, uma atitude criativa de quem se torna sujeito de sua vida, e não mais o lugar: a postura, e não a posição, eis o que conta.
Como exercer a ação política com ética? A primeira e fundamental maneira é através do exercício das funções públicas em conformidade com a lei. E quando uma lei é justa? Quando ela é boa para todos. Essa resposta nos foi dada por Condorcet, por ocasião dos acontecimentos da Revolução Francesa (1743 - 1794).
A lei é a medida externa, visível, pela qual os atos são medidos. Agir de modo ético na vida pública é cumprir a lei. No entanto, a eficácia da lei fica comprometida por alguns fatores, dentre os quais destacamos três. Primeiro: a mentalidade de que o importante não é cumprir a lei, e sim evitar ser flagrado na infração. Por exemplo, enriquecer por meio do tráfico de influência, sonegar impostos, arrecadar verbas através da coação e expectativa de ganhos (ilegais) futuros: vê-se problema nisso apenas na possibilidade de ser descoberto e não na prática enquanto tal. Segundo: a certeza da impunidade, seja pelo uso de artifícios jurídicos, seja por acordos de quadrilha, como se desenha costumeiramente nos casos de corrupção. Terceiro: manobras e pressões em benefício próprio. Vê-se que quem partilha dos privilégios do poder pode fazer pressão para desviar a atenção de um problema, retardar ou até anular uma ação investigativa que vise apurar os fatos de maneira incontrovertível.
Onde estão as principais falhas (responsabilidades) dos governantes? Apenas de forma indicativa, vamos referir duas que parecem fundamentais.
Primeira: na convicção de que existiriam quadros partidários moldados por princípios éticos tão profundos que os “blindariam” contra toda possibilidade de corrupção. Alguns partidos cultivam a imagem de “partido da ética na política”. Em geral, a imprudência de pensar que existem quadros político-partidários imunes às tentações do dinheiro fácil está na origem da corrupção.

Regra de ouro: quanto mais imune alguém se considera tanto mais exposto ao risco ele se torna.

Segunda: na deliberada manutenção das estruturas de corrupção construídas ao longo do tempo em nosso país. Quais estruturas? Destacamos quatro que nos parecem mais perniciosas.
Primeira: a estrutura de cargos de livre provimento do poder executivo. Em todas as esferas da administração pública, os governantes estão autorizados a preencher um número considerável de cargos obedecendo unicamente critérios de conveniência política.
É ali que, em geral, são acomodados os candidatos derrotados nas eleições, os militantes mais dedicados, os parentes mais próximos, etc., numa verdadeira partidarização das agências do Estado. Tudo funciona como moeda de troca para, na melhor das hipóteses, angariar apoios a fim de alcançar maioria na esfera legislativa. Em muitos casos, porém, é o caminho pelo qual se instalam as estruturas de fraude e corrupção.
A solução desse tipo de problema não requer, necessariamente, uma “privatização” das instituições públicas desses subsistemas — que podem envolver saúde, transportes, educação, canais de televisão pública, etc. —, mas pode passar pelo estabelecimento de um sistema gerencial de gestão, bem como por um controle público desses setores por parte dos órgãos de fiscalização.
Requer, porém, uma redução drástica no número de tais cargos para algo em torno de 5% em relação ao existente. A estrutura de cargos do Estado deve ser deixada aos cuidados de funcionários de carreira escolhidos por mérito, ou seja, teríamos a meritocracia como norte da gestão pública.
Segunda: as emendas individuais ao Orçamento. O expediente é utilizado sob o pretexto de atender as necessidades das comunidades às quais o parlamentar está vinculado. Na prática, porém, é um instrumento que alimenta o clientelismo político. Por um lado, o parlamentar utiliza os recursos públicos para obter vantagens pessoais, ainda que, no melhor dos casos, isso signifique apenas o voto dos eleitores.
 Por outro lado, o governante se serve do expediente como moeda de troca, na base da máxima “é dando que se recebe”: troca apoios no parlamento por liberação de recursos para as emendas dos parlamentares. Extinguindo-se esse expediente, impede-se a ação corruptora dos governantes e o clientelismo dos parlamentares. O Orçamento deve ser do município, do estado ou da união, e não deste ou daquele parlamentar. Agir em conformidade com essa ideia é agir  a partir da alta política.
Terceira: a estrutura partidária. Os representantes são eleitos dentro de partidos e a partir de um programa de ação. Podem, porém, trocar livremente de legenda e ignorar o programa de ação proposto sem que lhes acarrete qualquer punição. Essa sistemática tem servido para práticas descaradas de corrupção: o poder executivo algumas vezes compra (por vezes literalmente!) a maioria parlamentar na dimensão que lhe convém. Os recursos do tesouro financiam as trocas de partido e os votos aos projetos do executivo.
Para estancar esta fonte de corrupção, impõe-se uma reforma que obrigue a fidelidade partidária que puna com perda do mandato a troca; que institua o financiamento público das campanhas proibindo qualquer doação privada de pessoas e empresas; e que crie uma cláusula de barreira pela qual só podem ter representação legislativa partidos com determinado porcentual de votos.
Quarta: os órgãos de fiscalização. Os Tribunais de Contas, encarregados de acompanhar e fiscalizar as contas da Administração Pública tornam-se, muitas vezes, suspeitos devido à forma como são designados seus membros e é mantida sua estrutura. Escolhidos pelo chefe do poder executivo, sua manutenção depende diretamente da ação do governante. Poderíamos acrescentar a isso as Comissões Parlamentares de Inquérito. Levantamento publicado pela revista Veja (ano 45, n.19 p.70) mostra que os deputados criaram 29 CPIs no período compreendido do segundo mandato de FHC e o primeiro de Lula com um total de 969 indiciados. No entanto, nada aconteceu a nenhum deles, reforçando a sensação de impunidade de que falamos acima.
A ética dos princípios (a que orienta nossas ações cotidianas) nos acostumou à ideia de ver o mal unicamente nas ações individuais. Ainda que, a princípio, seja verdade que é sempre um sujeito que age (e não uma instituição ou estrutura social), este modo de pensar nos faz acreditar em soluções falsas.
 Sempre que surgem denúncias de corrupção nos quadros políticos institucionais, a solução que todos esperam é de que esta pessoa, quando ocupa algum cargo público, deve ser substituída por outra e punida na sua falha. Ainda que isso seja necessário, é um equívoco pensar que resolve o problema.
Onde está o equívoco dessa solução? Em não perceber que a corruptibilidade humana não oferece segurança alguma de vitória sobre o mal com a simples substituição das pessoas. Falta articular a punição dos culpados à mudança nas estruturas facilitadoras da corrupção, como aquelas que apontamos acima.
Isso, evidentemente, não equivale a dizer que a correção ética individual é indiferente. Pelo contrário, a formação ética sólida é imprescindível. O que ressaltamos é que unicamente a consciência ética individual não garante uma vida pública assegurada contra a corrupção.

Regra de diamante: O que protege a vida pública são as instituições e os mecanismos de controle das ações dos indivíduos.

Portanto, é preciso que existam regras claras e objetivas que impeçam os indivíduos a agir segundo seu arbítrio subjetivo, ou segundo aquilo que lhes aconselha seu convencimento ético interior, tão somente. A integridade das instituições públicas não é assegurada pela presença de pessoas eticamente íntegras e sim por mecanismos que as protejam do assalto dos indivíduos.
Evidentemente que existem outras razões que possibilitam a superação da relação entre ação política e paixão erótica, mas essas você poderá acrescentar a partir de sua reflexão.
Nossa reta intenção é escrevermos para que tais escritos façam bem a quem os ler. Esperamos que tenha sido esse o caso.


[1] José Luiz Ames é doutor em Filosofia, professor da Unioeste. E-mail: profuni2000@yahoo.com.br
Ivo José Triches é diretor das Faculdades Itecne de Cascavel e Professor Titular do Centro de Filosofia Clínica de Cascavel. E-mail: ivo@itecne.com.br  blog: www.itecne.edu.br/ivo


quinta-feira, 10 de maio de 2012

ação política e paixão erótica: a política pequena





Por Ivo Jose Triches e José Luiz Ames*

É possível estabelecer uma relação entre ação política e paixão erótica? O que leva o homem a agir politicamente e o que o atrai eroticamente? Nietzsche sugeriu que se tratava da “vontade de poder”: a existência de um desejo instintivo no homem de impor a si mesmo e aos outros sua própria escala valorativa. Aristóteles acreditava que tanto a ação política quanto a erótica eram respostas à tendência humana de realizar fins: a vida boa na política e a procriação na erótica. E para Maquiavel?

O homem, para Maquiavel, é um ser solitário e autointeressado que faz o bem quando é obrigado e o mal sempre que tem oportunidade. A solidão que atinge a essência do homem o faz enfrentar o problema: como alcançar a união, como transcender o solipsismo da vida individual e encontrar compensação? Enquanto o homem permanecer prisioneiro de sua solidão será incapaz de dominar ativamente o mundo, as coisas e as pessoas. Em outras palavras: se ele decidir viver só, estará fadado ao fracasso em todos os sentidos.

A ação política e a paixão erótica emergem como meios de romper as cadeias que prendem a alma humana e impulsionam o homem ao encontro dos outros em busca de compensação.

O prazer do poder político, assim como prazer da paixão erótica, está baseado na sensação de submissão. O erótico, na paixão, é o meio pelo qual se possui a uma pessoa, mas somente por um instante. O exercício do poder político, em compensação, é a possibilidade de possuir a muitas pessoas e por um tempo prolongado. O exercício do poder produz prazer constante. Contudo, se a posse erótica é mais breve do que a política, o orgasmo lhe confere maior intensidade. 

O erótico e o político estão unidos por uma mesma paixão humana: o poder. Poder é a capacidade de controlar a vontade do outro e impor-lhe determinado comportamento, mesmo contra sua vontade. Na ação política e na ação erótica, o controle da vontade do outro é tanto mais eficaz quanto mais prescindir da força bruta. O verdadeiro dominador é um encantador de serpentes. Ele faz uso da comunicação perlocucionaria objetivando atingir seus fins que é manter-se no poder.

O mundo da ação política é, por definição, pura presentidade. Aqueles que vivem nele são obrigados a tomar decisões no agora e aqui. Ali onde o presente é toda a realidade, onde o futuro se resume a escolhas presentes, domina a frivolidade. Neste mundo, as pessoas são levadas a querer usufruir imediatamente tudo quanto é possível. A regra de ouro é: gozar o tempo presente. 

É aqui que o erótico e o político se fundem. Os dois são fruições instantâneas, maneiras de eternizar a glória fugaz de um momento privilegiado: a vitória no jogo político é o equivalente do orgasmo no prazer erótico. Os escândalos sexuais que movimentam o noticiário político, em todas as esferas de organização do poder, são expressões da frivolidade de um mundo que não conhece sonhos. Basta recordar as fantasias do ex-presidente americano Bill Clinton com a sua Mônica Levinski. Na política e na erótica, é no agora e aqui que tudo se decide. É no agora e aqui que tudo é usufruído. A regra é o máximo de prazer pelo maior tempo possível. Aqui tudo é efêmero, nada pode ser apreendido. A frustração é o sentimento inevitável num mundo em que tudo precisa ser gozado imediatamente.

A aproximação entre o erótico e o político, na maneira como foi feita aqui, gera certo desencanto, com a política! Com efeito, se a ação política se rege pelo prazer efêmero da fruição, do gozo, da vitória à semelhança do orgasmo na relação erótica, o que podemos esperar dela? Será que a política não consegue ser mais do que um jogo em que interessa unicamente vencer, em que importa tão somente o resultado?
Quando olhamos para a ação política tal como ela acontece, a única resposta possível é de que ela não passa de um jogo em que interessa a vitória dos competidores. Não há finalidades substanciais, não existe nada de permanente a ser esperado dela. O destino da ação política é ser isso? Não há nada a ser feito para transformar a ação política em uma construção de um mundo de justiça, liberdade, igualdade? Será possível fazer da ação política uma obra que se dirija aos outros e não à satisfação dos próprios competidores?

Essa forma de ser de muitos que vivem no mundo partidário em nosso país, faz parte da “política pequena” como dizia Antonio Gramsci (1891-1937). Para que alguém consiga chegar à “grande política” é necessário que consiga transcender essa visão de mundo. E qual é essa nova visão? No próximo artigo indicaremos alguns caminhos. Contudo, abaixo você encontrará uma pista..

Voltemos por um instante à comparação da ação política com a paixão erótica. O eros é desejo de fruição insaciável. Quer possuir o outro como objeto de satisfação. Como a saciedade jamais acontece, é frustração. Somente quando o outro deixa de ser algo a ser possuído para ser alguém para ser amado, emerge a possibilidade de ser feliz. Para amar é preciso deixar o outro ser, é preciso querer seu bem não porque nos faz falta, mas simplesmente porque ele existe, porque a pura existência dele é motivo suficiente para amá-lo. 

Na ação política é preciso que um movimento semelhante aconteça para que se transforme de um jogo em que interessa tão somente o resultado em uma obra na qual é visado o conjunto da comunidade política e não os competidores do jogo. Enquanto a ação política se resumir à disputa entre partidos pela posse do poder, ou de indivíduos pelo domínio uns sobre os outros, ela não conseguirá ser mais do que fugacidade, esforço vão de eternizar a glória da vitória momentânea. Enquanto a ação política for isso será igual ao orgasmo na relação erótica: um prazer fugaz impossível de ser retido. Como fazer a ação política transformar-se de jogo de poder em vista do resultado em instrumento de construção para uma sociedade justa? A resposta é tão complexa quanto a outra: como fazer que a paixão erótica se transforme de fruição e gozo momentâneos em relação de amor? Resposta a essa questão está na segunda parte deste escrito que você poderá ler na próxima semana.



* José Luiz Ames é doutor em Filosofia, professor da Unioeste. E-mail: profuni2000@yahoo.com.br
Ivo José Triches é diretor das Faculdades Itecne de Cascavel e Prof. Titular do Centro de Filosofia Clínica de Cascavel. E-mail: ivo@itecne.com.br  blog: www.itecne.edu.br/ivo

quinta-feira, 3 de maio de 2012

Pobreza e (com)paixão




“Se eu dou comida a um pobre, me chamam de santo, mas se eu pergunto por que ele é pobre, me chamam de comunista.” (Dom Hélder Câmara)

A defesa das causas dos pobres é uma tarefa muito árdua. Exige da gente mais do que compreensão, discursos e teorias, mas, sobretudo, compromisso e compaixão. Somos muito preconceituosos para com o sofrimento dos pobres.

Desconhecemos sua realidade e não nos dispusemos a mexer na raiz de nossos problemas: a nossa forma de organizar o mundo. Entre nós é muito forte a idéia de que pobres são coitados, por isto desprovidos de sorte e de bens. Se não lutam, são preguiçosos. Se lutam e exigem, tornam-se perigosos. Mesmo quando passam fome, a gente insiste em dizer que eles ainda são capazes de sonhar.

Só a lucidez da razão e a sensibilidade podem tratar bem das questões da existência e convivência humanas. Na visão ocidental, desenvolvemos a ilusão de que somente a razão nos dará respostas aos problemas humanos. Nem a razão ornamental (que serve de ornamento), nem a razão instrumental (ferramenta para transformar a realidade) são capazes de justificar o sofrimento e a realidade daqueles que excluímos socialmente (os pobres). Os pobres não são invenção, não são uma idéia. Os pobres são reais. Os pobres existem, e sofrem a violação de sua vida e dignidade.

Leonardo Boff, defensor incansável das causas dos pobres e oprimidos, afirma que são três as compreensões que se tem da pobreza. Uma primeira, clássica, é a idéia de que o pobre é aquele que não tem. A estratégia então é mobilizar quem tem para ajudar a quem não tem, através de ações assistencialistas, sem reconhecer a potencialidade dos mesmos. A segunda idéia, moderna, é aquela que descobre os potenciais do pobre e compreende que o Estado deve fazer investimentos para que ele seja profissionalizado e potencializado, com fins à inserção no mundo produtivo. Ambas as posições desconsideram, na visão de Boff, que a pobreza é resultado de mecanismos de exploração, que sempre geram enormes conflitos sociais.Boff acredita que é preciso reconhecer as potencialidades dos pobres não apenas para engrossarem a força de trabalho, mas principalmente para transformarem o sistema social. Os pobres, organizados e articulados com outros atores da sociedade, são capazes de construir uma democracia participativa, econômica e social. “Essa perspectiva não é nem assistencialista nem progressista. Ela é libertadora”.

Só a compaixão reveste-se de libertação. Compaixão não é sofrer pelos outros, mas sofrer com eles. O sofrer com os outros permite à gente colocar-se em seu lugar. Enxergar a partir dos seus pontos de vista e de suas realidades. É também deixar-se transformar, permitindo que os nossos mais nobres sentimentos se traduzam em ações concretas a favor dos pobres, fracos e marginalizados.

Poucos vivem a compaixão. Muitos perderam a sensibilidade, o que os impossibilita de viver a caridade e o amor ao próximo. Outros preferem atribuir aos pobres a culpa por sua situação de miséria e vulnerabilidade. Outros discursam democracia, não perguntando se esta propicia as mesmas condições e oportunidades a todos, como ponto de partida. Poe que o ponto de chegada depende de cada um de nós. E muitos, em grande número, tratam como crime a atitude de quem luta por causas humanitárias, quando estas exigem uma mudança na estrutura e organização da sociedade.“As pessoas são pesadas demais para serem levadas nos ombros. Leve-as no coração”, disse Dom Hélder Câmara. Este o sentido maior da compaixão para com os pobres: não os defendemos por serem bons ou anjos, mas porque são parte de uma sociedade desigual, que não sabe lidar com eles.

Nei Alberto Pies, professor e ativista em direitos humanos.