quinta-feira, 24 de fevereiro de 2011

MITO E FILOSOFIA, PLATÃO E ARISTÓTELES

*Ivandilson Miranda Silva

O mito é a primeira explicação, produzida pela humanidade, para justificar a existência dos fenômenos que rondavam o nosso mundo. A principal característica desse tipo de explicação era o discurso fabuloso, ilógico, sobrenatural, não racional. Geralmente, acreditava-se numa pessoa mais experiente que tinha autoridade por ter testemunhado o fato que está narrando ou por ter recebido a notícia de quem testemunhou os acontecimentos narrados.

A Filosofia nasce da necessidade de explicar os fenômenos de forma racional e lógica, saindo do mundo mágico e misterioso da mitologia. Mas não podemos deixar de considerar que a mitologia provoca o surgimento do pensamento filosófico.A filosofia, então, vai dando os seus primeiros passos com os filósofos pré-socráticos e se paradigmatiza com Sócrates que acreditando nas potencialidades da razão aponta o caminho para uma vida ética a partir do controle dos instintos. O pensamento racional já estava instaurado na Grécia antiga.

Os pós-socráticos, em especial, Platão e Aristóteles, vão criar escolas filosóficas com perspectivas bem diferenciadas demonstrando assim que a principal característica da filosofia é a produção de ideias e o debate público dessas indagações sobre a vida, a morte, o bem, o mal, o quente, o frio, o Ser e o Devir, a existência e essência...

As principais questões apresentadas por Platão na sua filosofia são: a preocupação com a política e os rumos do Estado, a ética, a estética , desconfia dos sentidos e recusa a passagem da sensação ao conceito, não se interessa pelo estudo da natureza, antecipa-se ao método de Descartes (1596- 1650) e acredita num mundo transcendente, onde estão as idéias inatas (nascidas conosco) nas quais se concentra toda a realidade, a razão aniquila e destrói as paixões. Sair da caverna é alcançar o mundo das ideias.

Aristóteles, mesmo sendo discípulo de Platão, não vai concordar com o seu pensamento apresentando um outro olhar sobre a filosofia que se caracteriza pela: vocação naturalista, observação do mundo físico/ concreto, onde os conceitos são tirados da experiência mediante a evidência, se interessa pelo estudo da natureza, o verdadeiro conhecimento vem da experiência, a razão governa e domina as paixões. “Nada está na mente que não tenha passado pelos sentidos”.

A partir dessas diferenças entre as concepções filosóficas de Platão e Aristóteles vamos construindo vários questionamentos sobre a origem e a verdade das coisas como: o que vem primeiro a idéia ou realidade, o conceito ou a experiência? os sentidos enganam? o que vejo não é verdadeiro, mas sim uma representação do que penso? preciso experimentar primeiro as coisas para depois criar os conceitos?

           Assim a filosofa vai consolidando as suas escolas. Empirismo, Racionalismo, Existencialismo, Idealismo e vários outros “ismos” presentes na teoria do conhecimento.

* Graduado em Filosofia Pela Universidade Católica do Salvador (UCSAL), Especialista em Metodologia do Ensino, Pesquisa e Extensão em Educação Pela Universidade do Estado da Bahia (UNEB), Mestrando em Cultura e Sociedade Pela FACOM-UFBA, Professor do Núcleo de Humanas da UNIME-PARALELA-SAVADOR. Blog: http://ivandilsonmiranda.zip.net

quinta-feira, 17 de fevereiro de 2011

A difícil arte de educar hoje

Benedito Luciano Antunes de França*

Há uma falsa impressão de que o mundo contemporâneo proporciona muitas vantagens. De um lado, bens e serviços estão muito mais acessíveis do que há décadas atrás, decorrência das novas políticas econômicas, do processo de globalização e do incremento da produção em massa. Por outro lado, o emprego, e a garantia dele, além de justos salários, não acompanharam tais facilidades. Enfim, inovações comerciais e desvantagens empregatícias são uma constante, afrontando, diretamente, as eventuais propostas de ensino e de aprendizagem no Brasil.

Não admitimos, em razão de sua natureza epistemologicamente propedêutica, que a escola seja refém das forças intransigentes do “mercado de trabalho”, pois este é o filho caçula da relação entre “mercantilismo” e o “pensamento liberal”, fato consumado nos últimos cinco séculos. Anterior a ele, já existia a sociedade humana caracterizada pela vida coletiva, pelo respeito às regras, pela reflexão dos direitos e deveres, além das relações interpessoais garantidas pela cordialidade e pelo diálogo contínuo. Assim, sem estes condicionantes, a existência da escola torna-se ilegítima.

Ora, ensinar por ensinar, fundamentado em princípios especulativos, utópicos ou metafísicos, ilegítima a instituição escolar, porquanto há outras exigências pedagógicas que vão além destas. Sabemos, inclusive, que o aumento do número de matriculados no ensino médio brasileiro, nos últimos três anos, está condicionado a uma busca permanente de aperfeiçoamento profissional, sem o qual, muitas vezes, o emprego, a estabilidade empregatícia, uma melhor remuneração, não é mais possível.

Portanto, a escola deve, quando possível, adequar seus componentes curriculares e, por conseguinte, os seus conteúdos programáticos, a tais reivindicações; não como fim do processo pedagógico, mas como um meio. Visto que educar, desvinculando-se da realidade existencial e histórica, é projetar para o mundo social um sujeito alienado, inapto para o mercado e, sobretudo, para a existência social compartilhada.

quinta-feira, 10 de fevereiro de 2011

Para início de conversa Refletir sobre a Reflexão

Prof. Geverson Luz Godoy

Palavras chaves:
Refletir, espelhar, pensar, analisar, compreender, articular, administrar, clarear, flexibilidade, valores, ética, política, atitude, tomada de decisão, ser humano, tolerância, ser exemplo.

A cada ano que se inicia, fazemos um balanço sobre a vida, seus valores e acontecimentos. Começar bem é 50% da caminhada e, nada melhor do que iniciar com uma reflexão sobre a reflexão.

Ao refletir um pouco sobre alguns conceitos e a vida, cheguei num ponto em que pensei ser a reflexão algo bastante curioso. Tentarei fazer uma analogia entre o pensar enquanto reflexão e o reflexo do espelho, assim como o olhar de outras pessoas como nossos espelhos. Concluí que o pensamento, o espelho, o vidro e o olhar pertencerem ao mesmo grupo da reflexão.

O que me levou a esta analogia é que quando me vejo no espelho, e me deparo com a minha imagem refletida no mesmo, percebo que não me vejo da mesma forma que as outras me vêem, referindo-me apenas a condição física, considerando que os outros percebem em nós tantas outras dimensões além da condição física. Porém as duas formas possuem as suas individualidades e importância.

O olhar assim como a percepção, é algo subjetivo, ou seja, propriedade do sujeito, portanto o que o espelho reflete a mim, ocasiona-me uma percepção e concepção da minha imagem, que não é percebido da mesma forma pela leitura de outras pessoas.

Aqui temos dois instrumentais de devolução de imagem, e/ou comportamento, que mediam o conhecimento sobre a mesma. O espelho enquanto instrumento estático, reflete e representa a imagem fidedigna ao que é, já o olhar das outras pessoas nos devolvem as suas leituras da percepção de nossa pessoa, física ou comportamental.“Somos espelhos uns dos outros, pois as outras pessoas são quem nos transmitem aquilo que não percebemos em nós”. (Geverson Luz Godoy)

Assim como o contato com a nossa imagem devolvida pelo espelho, a descrição de outra pessoa, faz termos outra concepção de nós mesmos, que não teríamos se não nos conhecêssemos por estes meios, espelho e pessoas. Acredito até que este processo da contemplação de nossa imagem no espelho, ou sermos percebidos por outras pessoas, nos tornam um pouco mais humanos, pois através do processo de reflexo, podemos saber como estamos e representamos no mundo.

Vou falar um pouco da escola, que é o local de socialização onde nós educadores nos relacionamos a maior parte do tempo e onde todas as nossas dimensões: físicas, religiosas, políticas, pessoais, humana-afetivas, são analisadas por todos os que fazem parte desta comunidade, principalmente pelas crianças. Conforme for o comportamento do professor, pode ser um ótimo espelho aos seus formandos, enquanto algo a ser seguido, como bússola, paradigma, modelo a ser copiado.

Em um primeiro momento levei em consideração o olhar e percepção enquanto espelho e devolução de imagem e comportamento, neste segundo instante o espelho são os comportamentos dos adultos a serem seguidos pelas crianças, educandos. Isto nos revela que o ser humano é sujeito e objeto de sua própria educação. Nos espelhamos no olhar de outras pessoas, o que pensam sobre nosso comportamento, assim como espelhamos aqueles que desejam seguir nosso caminho.

Toda esta analogia é para enfatizar que a reflexão é um processo em contínua mutação, que sofre metamorfoses e que depende de nossos sentidos e percepção para a sua compreensão.

Até então falei de objetos externos de reflexão, daqui em diante, inicio outro processo de reflexão, na forma de compreender o homem em Pascal onde afirma ser o homem um caniço pensante. Quero olhar para dentro de meus pensamentos e perceber o que compreendo sobre o assunto do momento, Educação, Ética e Política, ou educação ética na política que é o que nos tem faltado.

Educação, Ética e Política, acredito que são três conceitos responsáveis pelo equilíbrio na convivência entre as pessoas e o cosmo. A Educação responsável pela tomada de posse do conhecimento de conceitos e das regras, a Ética responsável pela criação e manutenção das mesmas, dentro de um bom senso humanístico, e a Política pela garantia de manutenção e administração das regras, mantendo sempre o bom senso, garantindo uma boa convivência entre as pessoas na sociedade.

Penso que toda ideia exposta seja tendenciosa, voltada para uma ideologia, uma corrente, um sistema, uma metodologia, enfim, a ideia transmitida através da palavra escrita ou falada possui um ponto de partida em nossa formação de concepção das coisas, pois somos seres situados no tempo e espaço, de forma social, política, psicológica, antropológica, histórica, religiosa. Ninguém é neutro, todos possuímos conhecimentos e ignorâncias, a segunda em maior grau que a primeira.

“As avaliações positivas de outrem sobre nossa pessoa nutrem nossa autoestima, as avaliações negativas fortalecem nossa autoconsciência” (Geverson Luz Godoy)

Falando em ignorância, lembrei-me do grande filósofo grego Sócrates. O que sabemos sobre Sócrates foi-nos transmitido por outros filósofos que foram seus discípulos, como Platão por exemplo, que fala sobre a vida do mestre em seus diálogos.
A forma de Sócrates compreender o mundo foi espelhada em sua mãe, que era uma parteira. Espelhando-se então na metodologia da profissão da mãe, Sócrates criou o seu método filosófico chamado “maiêutica”, que significa tirar de dentro. O comportamento de Sócrates correspondia ao que pregava, pois na sua sempre busca pela verdade, dizia nada saber, “sei que nada sei”, afirmando que sempre temos o que aprender. Para alcançar o seu objetivo de busca pela verdade, o filósofo utilizava a dialética como metodologia.  Através do diálogo, Sócrates levava o seu interlocutor ao ponto de reconhecimento que não tinha posse do saber sobre o determinado assunto em questão.

Parafraseando um pensador brasileiro, Mario Sérgio Cortela, traz-nos como regra de vida e título de uma de suas obras, “Não nascemos prontos”. Compreendendo isto, devemos rumar para a construção do ser humano, que é o que queremos ser. A vida humana é um tempo curto, mas o suficiente para a compreensão de que podemos ser melhores a cada dia. Nesta obra, Cortela diz que ao passar o tempo não ficamos mais velhos, muito pelo contrário, neste exato momento afirma o autor, que sou a versão reeditada, revisada e ampliada do novo eu. Não somos como os objetos, lápis, geladeira, calçados que nascem prontos e vão se acabando para a sua finalidade conforme sua utilização. Nós humanos vamos sempre acrescentando conhecimentos, experiências e vivências que vão tornando-nos cada vez mais humanos.

É sobre a construção do SER Humano que temos que trabalhar com mais afinco. Precisamos afirmar valores positivos, pois tenho percebido uma metodologia (espelho) enfraquecida nas abordagens governamentais quando se referem a assuntos de saúde pública, segurança e educação por exemplo. Um exemplo é o caso do tabagismo, onde nos finais das belas propagandas de cigarros, o ministério da saúde adverte que fumar é prejudicial a saúde. Nas carteiras de cigarros aparecem fotos de pessoas com câncer de pulmão, com enfisema pulmonar, impotência sexual, queda de cabelo, aborto e etc. A metodologia do ministério da saúde não deveria ser de forma positiva? Oferecer meios saudáveis as pessoas para manterem sua saúde física e mental ocupadas, de forma que não necessitem de uma substancia química que provoque vício e malefícios a sua saúde seria de bom grado, como por exemplo: Pratique esporte, exercício físico fortalece sua saúde cardíaca.

Para ajudarmos neste processo educativo democrático - Ético-político - é necessário que orientemos os educandos (que sejamos espelhos) desde a primeira infância para a compreensão do que realmente importa na vida humana. Valores como a felicidade, construção da identidade, ver o outro como extensão de mim, respeito, cordialidade, cooperatividade, auteridade, simplicidade, humildade, fidelidade, cumplicidade, critérios, esperança, acreditar nos próprios sonhos, verdade, companheirismo e saber tomar decisões, valores desenvolvidos pelo S.E.R. (Sistema de Ensino Reflexivo) dentro das comunidades de aprendizagem investigativas.

Ocupados com outros valores (contra-valores) e conceitos, as pessoas que não saboreiam os valores que apresentei acima tornam-se adultos individualistas. Nesta visão de mundo, o cigarro que fumam, pagam com o seu dinheiro, portanto ninguém tem o direito de lhes cobrar algo.

Pragmatistas a ponto de não valorarem sentimento de fraternidade, imediatistas  a ponto de fazerem política da mesma maneira que se torce para um time de futebol, hoje se torce para um partido, amanhã para outro, conforme conveniências pessoais, partindo ao meio seus próprios partidos, e diante deste todo, a democracia se torna uma ditadura da maioria que não sabe que rumo tomar, por não saber onde quer chegar... Como já dizia o filósofo poeta Sêneca “não há vento favorável para o marinheiro que não sabe aonde ir”. Este mundo imediatista, materialista, individualista, tem ensinado que somente nós (indivíduo) podemos ser felizes e que, não dependemos de mais ninguém para isto.

O que estas teorias não levam em consideração é que a felicidade se constrói com valores positivos, tolerância, ética, práticas educacionais consistentes e políticas adequadas a uma boa convivência na comunidade.

Através da filosofia, utilizando uma corrente humanista, fundamentada na escola de Frankfurt, com características metodológicas sócio-histórico-construtivista, há 22 anos fazemos um grande trabalho na educação, chamando a atenção de todos os educadores, pais, professores e alunos, para participarem de uma educação reflexiva (Educação para o Pensar, Filosofia com Crianças, adolescentes e jovens). Queremos que todos possam fazer parte de uma grande comunidade de aprendizagem investigativa construindo todos juntos, novas vivências e conceitos, enfatizando muito mais o processo de aprendizagem do que o produto, pois somos eternos aprendizes no que diz respeito ao objeto humano.

Esta é a importância de outras pessoas em nossas vidas, ajudar-nos neste processo de espelhamento, para que possamos ter a consciência do que e de quem somos perante o universo, e procurarmos cada vez mais sermos melhores para conosco, com os outros, com a vida e com o mundo.

Para isto, enquanto espelhos precisamos orientar nossos educandos, para um pensamento de forma correta, coerente, crítica, criteriosa, autentica, autônoma, lógica, ética, estética e politicamente correta.

Concluo meu pensamento dizendo que a demagogia, “Faça o que eu digo, mas não faça o que eu faço”, é a melhor forma de se colocar a perder os valores humanos supracitados, ou seja, pode ser um espelho desfocado, quebrado e que apresenta imagens destorcidas.

Prof. Geverson Luz Godoy
Assessor filosófico pedagoógico do S.E.R
godoy@portalser.net

quinta-feira, 3 de fevereiro de 2011

O filosofar desde o “primeiro sopro”

Denilson Aparecido Rossi

No presente artigo pretendemos apresentar, em forma de diálogo, uma reflexão sobre a filosofia desde o início da vida com a possibilidade intrínseca do SER humano.
A conversa ocorre entre dois personagens, “philos” e “sophia”. Inicialmente, o intento desses personagens, é dialogar em torno de algumas considerações gerais sobre a filosofia e o “primeiro sopro”. Depois, enfocaremos a questão antes da concepção, durante a gestação e após o nascimento do bebê e o pensar filosoficamente.

1. Considerações Gerais sobre a Filosofia e o Bebê
Philos – Bom dia Sabedoria!
Sophia – Bom dia Amigo!
Philos – Muito se escuta dizer que filosofia é coisa inútil, é coisa de louco. Diz-se ainda que a filosofia “é a ciência com a qual, ou sem a qual, o mundo continua tal qual”. Do outro lado se escuta dizer também que filosofia é algo muito polido, de difícil acesso e que somente algumas mentes demasiadamente superiores podem praticar. Você concorda com isso Sophia?
Sophia – Evidentemente que não. A filosofia é sempre mais do que se pode dizer e/ou imaginar. Filosofia é uma palavra de origem grega: philosophia. Philos, em grego, significa amigo e Sophia, significa sabedoria.
Philos – Ah! Sê entendi bem, filosofia significa então, amigo da sabedoria?
Sophia – Isso mesmo! A filosofia se ocupa com o saber, com o conhecimento. O filósofo busca sempre saber mais... conhecer mais...
Philos – Como fazer para saber e/ou conhecer mais?
Sophia – Para tanto, a filosofia possui uma ferramenta, um método próprio. Trata-se de trilhar os caminhos da razão. A filosofia é a arte do pensar, indagar, querer saber o “por quê” das coisas. Filosofar é, portanto, buscar conhecer mais do que uma determinada coisa e/ou situação aparenta ser. Trata-se de buscar compreender de forma consciente e crítica as razões de ser e de viver no mundo. Longe de ser algo estéril ou inacessível a filosofia é o instrumento que nos possibilita a compreensão do sentido das coisas. A filosofia está diretamente relacionada ao cotidiano das pessoas. Sobre isso, Luckesi e Passos acrescentam dizendo que “a filosofia tem por objeto de reflexão os sentidos, os significados e os valores que dimensionam e norteiam a vida e prática histórica humana”1. Pode-se dizer, portanto, que viver sem filosofar é vegetar, é não-viver.
O homem em busca de sentido.
Pensar, indagar, buscar conhecer,
A própria razão de ser,
O que significa viver.
Isso é filosofia.
É sabedoria.
Os anos passam ligeiro.
Os fatos se sucedem.
O tempo inteiro,
Muitas coisas acontecem.
Mas, qual o sentido de ser?
Dos anos, dos fatos, do tempo, das coisas?
Perguntar o por quê?
Isso é filosofia,
É saber.

Philos – Se a filosofia está diretamente relacionada ao cotidiano das pessoas significa que ela também tem algo a ver com o bebê?
Sophia – Perfeitamente! O bebê é mais que um novo fato na história da humanidade. O bebê constitui-se num novo ser que interpela por si mesmo uma razão de viver. Portanto, a idéia e o surgimento de cada bebê é uma nova possibilidade para se filosofar, isto é, um sentido para a vida buscar. O bebê traz consigo muitas interrogações. Muitas são as perguntas que surgem antes da concepção. Outras tantas que emergem durante a gravidez. Outras mais que são suscitadas depois do nascimento. Indubitavelmente são inumeráveis as indagações... o que, de certo modo, demonstra existir uma relação direta da filosofia com o bebê.


2. A Filosofia e o Bebê antes da Concepção
Philos – Olá Sabedoria! Gostaria que soubesses o quão significativo me tem sido nosso diálogo.
Sophia – Que bom saber Amigo! Saibas que estou sempre aberta a dialogar. Muito me agrada o diálogo, pois, ele é a possibilidade de expressar o já compreendido bem como buscar compreender o que ainda se pode expressar.

Diálogo.
A arte de compreender
O que muito se deseja saber.
Aproxima o conhecimento distante
Possibilita visualizar um novo horizonte.
O estranho passa a ser conhecido
O obscuro torna-se esclarecido.
Essencial é dialogar,
Todo dia.
Isso é filosofar,
É sabedoria.
Philos – Mas, de fato, o que a filosofia tem mesmo a ver com o bebê antes da concepção?
Sophia – Pois bem, se compreendemos a filosofia como o exercício do pensar, a prática dos por quês e a busca do sentido, facilmente entenderemos que ela tem tudo a ver com a questão do bebê antes da concepção. Antes que um bebê seja concebido é possível que muitas perguntas sejam elaboradas, dependendo do contexto em que se dará a concepção.
Philos – Como assim, dependendo do contexto? E, quais são as perguntas mais comuns?
Sophia – Veja bem Amigo! São vários os contextos que precedem uma concepção: um contexto seria a situação de um casal, casados, que muito se amam e muito desejam ter um filho e planejam concebê-lo; outro seria a situação de um casal, ainda não casados, mas que muito se amam e desejam ter um filho; outro contexto pode ser o caso de uma mulher que deseja ser mãe e pensa em conceber um filho de modo independente; outro seria o caso do homem que deseja ser pai, mas que não pretende se casar; outro ainda seria o contexto de pessoas que desejam conceber filhos gêmeos; um contexto muito peculiar também seria no caso de um dos cônjuges possuir determinada doença, no entanto, desejarem ter filhos; e, assim por diante...
É notório que cada contexto suscite indagações próprias. Imaginemos, por exemplo, o contexto em que o casal, casados, que muito se amam e muito desejam ter um filho, planejam concebê-lo. Seria natural, neste caso, como conseqüência do pensar (filosofar), fazerem-se perguntas tais como: Será que já é o momento certo de termos um filho? Como será esse filho? Queremos homem ou mulher? Pretendemos que seja, ou não, gêmeos? Quando vai nascer? O que queremos com esse filho? E, outras tantas mais...
Pensemos em um outro contexto: uma mulher que deseja ter um filho de modo independente. Neste caso, ela poderia se perguntar: Será que tenho o direito de conceber um filho de modo independente? Ou, por que eu não posso gerar um filho, sozinha? Será que essa criança vai se desenvolver bem sem a presença do pai? Qual o melhor caminho para conceber um filho de modo independente? Vou procurar um banco de espermas e fazer uma inseminação? Vou procurar um homem que se disponha a colaborar comigo? Será que, depois, o pai não vai me tirar o filho? ...
Dentre essas, outras perguntas se poderia fazer de acordo com cada contexto. Independente da situação é importante ressaltar que, paradoxalmente, as indagações criam conflito e, ao mesmo tempo, abrem caminhos, descortinam novos horizontes. O que, portanto, constitui-se num processo filosófico. Razão pela qual podemos dizer que antes mesmo da concepção o bebê já nos faz filosofar.

3. A Filosofia e o Bebê durante a Gestação
Philos – Prezada Sabedoria! Pode a filosofia interferir na vida de um bebê durante a gestação?
Sophia – E como pode Amigo! Mas antes de analisar a interferência da filosofia na vida do bebê, faz-se necessário compreender como pressuposto o que se entende por ser humano, considerando que o bebê já é, em potência e ato, um ser humano. Para tanto, podemos utilizar o conceito cunhado pelo filósofo brasileiro Henrique L. Vaz, para quem “o ser humano é constituído por estruturas (corpo, psique, espírito) e por relações (mundo, outro, absoluto)”.
Philos – Por primeiro, falas-me então da relação da filosofia e o bebê a partir da estrutura (corpo, psique, espírito) do ser humano.
Sophia – Pois bem! É natural que os pais, assim que recebam a notícia de que estão grávidos se ponham imediatamente a filosofar, isto é, a pensar e a fazerem-se muitas perguntas, tais como: Será que o coração dele já está batendo? Como pode desenvolver-se o corpo de um bebê dentro do útero da mãe? Que tamanho já tem nosso bebê? Será que seu corpo já está todo definido e é perfeito? Que cuidados precisamos ter na alimentação para não prejudicar a sua formação? Fumar e ingerir bebidas alcoólicas, que tipos de males causam no bebê?
O que se sabe é que até o terceiro mês, principalmente, qualquer coisa pode ser fatal para o bebê. E que durante toda a gestação o bebê é nutrido pela mãe. Portanto, o desenvolvimento do feto, em termos de corpo, depende diretamente do que e de como a mãe se nutre. São inúmeras as questões que se prestam em torno do desenvolvimento do corpo do ser humano ainda no ventre materno.
Em se tratando da psique não é diferente. Desde a concepção até o nascimento trata-se de um longo percurso no qual a mãe experimenta diferentes situações emocionais.
Faz-se necessário interrogar-se: nesse período, tudo o que se passa na psique da mãe não pode ser absorvido pelo filho? Quando a mãe está feliz será que o bebê também se sente feliz? Quando a mãe está triste o bebê se sente triste? Quando a mãe sente raiva, medo, insegurança, angústia, dor e outros tantos sentimentos de desconforto o bebê também os sente?
Por outro lado, quando a mãe sente paz, coragem, segurança, harmonia e outros sentimentos de conforto, o bebê também os sente? Os sentimentos ou estado emocional do pai também influenciam no bebê? Se o pai ou a mãe rejeitar o bebê que tipo de influência psicológica isso exercerá no filho? A questão da projeção de desejo com relação ao sexo pode interferir na psique do bebê? Se os pais desejarem muito uma menina e vir um menino, ou o contrário, como ficará a psique dessa criatura? Até aonde atinge a psique do bebê o que se passa na psique dos pais?
No que se refere ao espírito é considerável perguntar quando é mesmo que começa a vida? Qual é o momento e como o espírito da vida é insuflado no ser humano? De onde provém esse espírito? Que força de espírito tem o bebê já no ventre materno? Durante o período gestacional pode evoluir o espírito do ser humano?

Perguntar,
É desejo de saber,
É buscar conhecer,
É filosofar.

Philos – Muito bem Sabedoria! Mas, como fora me dito antes, além da dimensão estrutural o humano se caracteriza também como um ser de relações (mundo, outro, absoluto). Podes-me dizer mais sobre isso?
Sophia – Sim Amigo! Antes, porém, quero ressaltar que seu nobre desejo de muito saber e buscar conhecer é a razão pela qual me faz responder. De fato, o ser humano é um ser de múltiplas relações. Relações estas que se dão com o outro, com o cosmo, com o absoluto e, seguramente, consigo mesmo.
Pensando no bebê, durante a gestação, vale interrogar: as relações que os pais exercem com consigo mesmo, com o outro, com o mundo e com o absoluto até que ponto influencia o filho? Tudo o que a gestante escuta, vê e imagina pode ser escutado, visualizado e imaginado pelo bebê? Os pais podem ensinar o bebê a se relacionar com as pessoas, com o mundo e com o absoluto de modo respeitoso e amoroso, mesmo o filho ainda estando no ventre? E assim por diante...

Ser de relação
O homem é sem igual.
Relacionar-se é sua condição
De ser como tal.

Além das questões acima abordadas com relação à filosofia e o bebê, durante a gestação, nota-se ainda a necessidade de considerar outras mais: quando o nosso filho vai nascer? Será que os resultados e previsões constatados nos exames de ecografia (ou ultra-som) são verdadeiros? Até que ponto os exames não falham? Como ele vai nascer? Nosso bebê vai nascer de parto natural ou será preciso fazer cesariana? Vai se parecer com o pai ou com a mãe, ou ainda, com os dois? Qual será a cor dos seus olhos? Vai nascer com saúde? Mais... ???
A cada pergunta um tempo desprendido para se pensar, com isto, percebe-se, portanto, que há um exercício constante: o filosofar.

Filosofia e bebê
Antes de nascer.
Tudo a ver.

4. A Filosofia e o Bebê após o nascimento
Sophia – Prezado Amigo! Com o nascimento do bebê dá-se o encontro com um novo ser humano e, conseqüentemente, com muitas respostas para as inúmeras perguntas até então elaboradas em torno desse ser. Sobretudo, em torno do corpo, muitas respostas são encontradas. Agora, já se sabe se o corpo é perfeito, com quem se parece, se é homem ou mulher, o tamanho, e outras mais... Todavia, surgem outras perguntas de acordo com cada situação.
Philos – Como assim, outras perguntas? Por quê, de acordo com cada situação?
Sophia – Isso mesmo! Uma é a situação na qual o bebê nasce perfeito. Outra quando o bebê nasce com alguma necessidade especial. Outra ainda quando nascem gêmeos, trigêmeos... E, podem ocorrer outras situações...
Philos – No caso do bebê nascer perfeito, por quê fazer perguntas?
Sophia – Porque viver é filosofar. A vida por si só se encarrega de novas questões apresentar.

O tempo passou ligeiro
O bebê acaba de nascer.
Por primeiro,
O que fazer?

Como esta há outras questões a serem elaboradas: pode um ser humano ser perfeito? O que se entende por perfeito? Ser perfeito significa ter todos os membros e órgãos?
Ah! O bebê está chorando, por quê? Está com fome? Está com dor? O que fazer? O leite materno será suficiente para o bebê nutrir-se saudavelmente? Será preciso medicá-lo? É necessário estabelecer rotina (horário de mamar, de banho, de dormir, etc.) ou é cedo para preocupar-se com isso? Onde encontrar respostas para estas e outras tantas perguntas relacionadas às necessidades básicas? Será que os pais têm as respostas? Será que as respostas estão com o filho? Ou ainda, as respostas podem estar na relação entre os pais e o bebê?
No que tange à afetividade e sociabilidade é conveniente interrogar-se também: o que é importante fazer para que o bebê seja uma pessoa integrada afetivamente? O que fazer para que ele se desenvolva e seja sociável? O modo como os pais lidam com seus sentimentos e emoções, até que ponto interfere na afetividade do filho? O comportamento dos adultos influencia muito no processo de socialização deste novo ser humano? Como fazer o melhor para que o bebê cresça feliz e seja amável? Como será o futuro do bebê?
Philos – Estimada Sabedoria! Considerando o que me fora dito acima tenho a impressão que em torno do bebê, além das interrogações apresentadas, existe uma infinidade de outros questionamentos. Isso procede?
Sophia – Indubitavelmente, sua impressão procede caro Amigo! Como vimos, muitas são as perguntas que se prestam em torno do bebê, seja antes da concepção, durante a gestação, bem como depois do nascimento. Disto decorre nossa compreensão de que o bebê nos faz filosofar necessariamente. As interrogações são importantes para descortinar novos horizontes. A bem da verdade há que se dizer ainda que a profundidade das indagações é proporcional à importância que se dá ao bebê.

O bebê.
Quem ele é?
Um novo ser?
O que a filosofia,
Com ele tem a ver?

Vale a pena pensar
Com ousadia.
Isso é filosofar,
É sabedoria.
Denilson Aparecido Rossi
1 LUCKESI, Cipriano Carlos; PASSOS, Elizete Silva. Introdução à Filosofia: aprendendo a pensar. 5. ed. São Paulo: Cortez, 2004, p. 87.