quinta-feira, 25 de julho de 2013

Pobres e o que mais...


Os diferentes aí estão: enfermos, paralíticos, machucados, engordados, magros demais, cegos, inteligentes em excesso, bons demais para aquele cargo, excepcionais, narigudos, barrigudos, joelhudos, de pé grande, de roupas erradas, cheio de espinhas, de mumunha, de malícia ou de baba. Aí estão, doendo e doendo, mas procurando ser, conseguindo ser, sendo muito mais”.(Artur da Távola)

Escrever e pensar a partir dos pobres não gera status social, nem dividendos econômicos. Lutar com eles e por eles gera reações raivosas e incomoda aqueles que desejam manter privilégios. Aqueles que lutam com e pelos pobres sabem que estes precisam ser defendidos não porque sejam bons ou maus, mas porque são vítimas de um sistema econômico e político de exclusão, que não gera oportunidades em igualdade de condições para todos. Para quem ainda duvida disto, eis o que foi anunciado pela ONU: “90 milhões de pessoas devem cair em condição de pobreza extrema até o fim deste ano no mundo por causa da crise econômica mundial”.
Difícil crer que as pessoas pobres e excluídas não sejam vítimas; autores é que não os são; não escolheram viver na indignidade. Vítimas necessitam de defesa, ajuda e amparo, para que se lhes resgate a condição de dignidade. Dignidade confunde-se com liberdade, na busca que cada ser humano faz para constituir-se gente. Como disse Cecília Meirelles, “liberdade é uma palavra que o sonho humano alimenta e não há ninguém que não a busque e ninguém que não a entenda”.
Muitos perderam a noção de pertença à humanidade e não cultivam mais valores solidários. São moldados pela ideologia dominante que sugere que “a cada um é concedido conforme o seu empenho, o seu esforço, o seu talento”. Logo, a conclusão de que pobres são pobres porque assim o desejam. Ou que a condição de pobreza é resultado da falta de esforços e de vontade de cada um e cada uma. Outros desejam “enquadrar” os excluídos a partir de dados e estudos estatísticos, supondo que todos respondem do mesmo modo, mesmo nas diferentes adversidades e peculiaridades de vida de cada um.
A inclusão dos pobres na sociedade não é nada natural. Inclusão pressupõe reconhecimento recíproco da nossa condição de seres humanos, com necessidades básicas para viver bem. Exige também reconhecer-nos todos capazes de fazer nossas escolhas e desenvolver nossas habilidades e potencialidades. Supõe também dividir a riqueza e a renda, que resulta do trabalho e da tecnologia produzidos por todos. Significa construir oportunidades em igualdade de condições para todos, indistintamente.
Somamo-nos à Cláudio Brito, quando escreve interinamente na coluna de Paulo Santana do Zero Hora, dia 10 de julho: “precisamos encontrar formas de organizar a cidadania e a solidariedade dos muitos que ainda se compadecem com o sofrimento alheio dos excluídos. Quem doa esmolas ainda acredita que vidas podem ser recuperadas e salvas.”
Na democracia, deveríamos dar a todos o mesmo ponto de partida, pois o de chegada pode depender de cada um. “A verdadeira democracia não tolera a existência de excluídos”, disse Herbert de Souza, o Betinho. Só a solidariedade, no seu sentido mais amplo e profundo, será capaz de salvaguardar nossa condição de humanidade. Se “nascemos livres e iguais em dignidade e direitos” como preconiza a Declaração Universal dos Direitos Humanos, temos obrigação de cooperar com os outros, em espírito de fraternidade. Assim, mais humanos nos tornaremos.
Nei Alberto Pies, professor e ativista em direitos humanos.

quinta-feira, 18 de julho de 2013

Qual Educação queremos: O que uma Escola Reflexiva precisa?

[Editorial do Corujinha nº 72 – 2º trimestre/2013]

É inegável que vivemos um tempo que apresenta necessidades essenciais para a convivência entre as pessoas. Tempo em que a comunicação é instantânea, e as pessoas não conseguem dialogar, discutir ideias, ter paciência e colocar-se no lugar do outro.
Somando-se a isso e a outros fatores, educadores e escolas entram na “onda da moda”, colocada por grandes corporações e grupos empresarias, de que educar hoje é só oportunizar para os aparatos e, em alguns casos, espera-se que quinquilharias tecnológicas (entendam aqui os tablets, lousas digitais, smartfones, livros digitais...) façam a diferença na aprendizagem.
Porém, os grandes educadores de todos os tempos já deixaram legados do que é e como educar. Estão presentes na memória e, mais do que nunca, sendo necessários. Precisamos abrir espaços cada vez maiores para o diálogo que educa para a tolerância. Para o diálogo que aproxima e abre novas perspectivas. Para o diálogo que leva à investigação, ao questionamento, aos amadurecimentos e às transformações. Somente educaremos as gerações atuais e futuras abrindo espaços para o pensar, dialogar, discutir, investigar, e a sala de aula é o espaço privilegiado para isso acontecer. Essa sala de aula que deve ser transformada numa Comunidade de Aprendizagem Investigativa e que tem como mediação uma investigação e aprendizagem reflexivas, filosóficas.
Educação, Filosofia e Sensibilidade são o tripé da Escola Reflexiva no século XXI, e tudo o mais é mera “perfumaria”. Escola Reflexiva que desperta nas crianças, nos adolescentes e jovens o gosto pela vida, a alegria da convivência e a busca da simplicidade para conhecer e ser no mundo. Escolas e educadores que não vislumbram um filosofar vivo na sua prática filosófica se deixarão guiar pela “onda da moda” como tábua de salvação.
Este é o foco das ações e reflexões durante os preparativos aos 25 anos do Centro de Filosofia Educação para o Pensar e Editora Sophos.
- a entrevista com um grande educador e formador de opiniões no campo educacional, o Prof. Celso Antunes (pág. 3).
- O entendimento do logotipo que nos acompanhará até 2014, quando celebramos o Jubileu (pág.4).
- O lançamento do Prêmio “Troféu Amigos da Filosofia” – 4ª edição (pág. 5).
- O destaque no encarte especial ao Projeto Coruja Itinerantes, que percorre o País e oportuniza reflexões e ações interdisciplinares.
- Um sobrevoar pelas notícias, reflexões e ações de escolas de Norte a Sul do nosso País (pág. 6 a 11), mostrando um filosofar vivo.
Você que acredita e defende uma Escola Reflexiva e dialógica, venha construir conosco a sua e a nossa história jubilar, por meio de um filosofar vivo.

Prof. Dr. Silvio Wonsovicz
Presidente do Centro de Filosofia Educação para o Pensar


quinta-feira, 11 de julho de 2013

Sensibilidade, Educação e Filosofia


O medo tem alguma utilidade, a covardia, não”
(Mahatma Gandhi)

As crianças produzem as mais puras obras da sensibilidade humana e nos orgulham com seus ingênuos e inocentes encantos. Crianças, adolescentes e jovens facilmente percebem quando um professor ou professora lhes oferece sabedoria, recheada de amor e dignidade. Sabem também reconhecer, como reconhecem seus pais, que professores trabalham duro e não são reconhecidos e nem estimulados a realizarem-se, com dignidade, no seu ofício de ensinar. Deles, somente deles, os professores recebem flores e presentes, em forma de agradecimento e reconhecimento por tudo que fazem por eles.
A sensibilidade é própria daqueles que estão de bem com a vida e se envolvem numa catarse de movimentos que geram boas percepções de vida, de ser humano e de beleza, daqueles que tem olhos para ver, ouvidos para ouvir e boca para falar, serenamente. Por sua vez, quando reina a insensibilidade, esta gera auto-suficiência, arrogância e rancor, qualidades que não cativam e não agregam ninguém.
Oferecemos, todos os dias, o melhor do que somos, por amor às nossas crianças. Ofertamos a elas luzes de esperança, forjadas na cotidiana luta de superação pessoal e profissional. Se os adolescentes sonham em transformar o mundo, mostramos a eles caminhos de saudável rebeldia, arrebatadora de causas, sonhos e desejos que move a cada um e cada uma. Se jovens e adultos acreditam no poder do conhecimento, os estimulamos a fazerem suas buscas na vida pessoal e profissional, através de seus estudos.
Sensibilidades afetivas, sociais e políticas constituem um legado daqueles que escolheram ser professor ou professora. Por obra desta paixão, fazem-se compreensivos com os outros, e sofredores com eles, crentes que cada ser humano possui as mais ricas e únicas possibilidades de superar-se. Como na educação, também na política, só deveriam atuar aqueles que, acima de vaidades e interesses, sejam capazes de agregar-se na crença de que todo ser humano é capaz de superar-se em todos os seus contextos, singularidades e peculiaridades. Para isto serve a política e a educação: propiciar instrumentos às pessoas para sua liberdade e sua emancipação.
Daqueles que assumem posições de poder, espera-se que sejam abertos ao diálogo, mesmo que na dureza das críticas dos outros. Que se interessem pela coletividade, sem desfazer-se de suas motivações e convicções políticas. Que saibam avançar nas proposições, mas também recuar quando se faz necessário. Que desenvolvam habilidades capazes de justificar as intenções que desejam concretizadas na coletividade.
“Quem luta, também educa”. Quem ama, também educa. Quem não se acovarda de sua consciência, ganha mais vida na dignidade, justamente por assumir-se como é. Quem educa segue acreditando que educação não é um fim, mas meio para estimular os mais loucos desejos do ser humano: a felicidade. E não aceita o discurso desvairado que nos acusa de “torturar” nossas amadas crianças.
Nei Alberto Pies, professor e
ativista em direitos humanos.

quinta-feira, 4 de julho de 2013

Sonho social

Sonho social

Armando Correa de Siqueira Neto*

O sonho de conquista social pode ser o resultado direto dos desejos que se formam em um dado momento da vida. Por razões extremamente particulares, o ser humano é capaz de buscar sensações agradáveis no convívio através da realização de metas estabelecidas, as quais podem ser chamadas de sonhos. Motivos são importantes na vida de uma pessoa em razão da ocupação que demandam, permitindo que o tempo seja preenchido de alguma forma. No entanto, emerge uma pergunta fundamental: será que nos conhecemos o suficiente para definir mais adequadamente os tipos de sonho que devemos estabelecer?
Será que dispomos de suficiente autoconhecimento sobre as reais necessidades pessoais para alinhá-las aos sonhos por nós projetados? Criamos sonhos que na verdade não passam de desnecessários pesadelos (determinada carreira profissional, um dado relacionamento, posse de certos bens)? Alerta: muitos pais, ignorando o autoengano, estimulam seus filhos a perseguir o que, à luz da razão, causaria desestímulo? Mais: mesmo sob o torturante erro causado por objetivos irrefletidos, é possível manter-se crente de que é correto o caminho e persistir em tal desatino por tempo indeterminado? Quem sabe a hora de parar e rever a trajetória? Quem quer enxergar isso?
O sonho de sucesso social faz parte da nossa convivência há considerável tempo; em muitas culturas é possível localizá-lo facilmente. O sonho da glória social parece tão natural quanto necessário, haja vista ele surgir com veemência em diferentes pessoas, nas variadas classes sociais, notadamente desde a origem da civilização, além de se sofisticar gradualmente com a evolução tecnológica. No entanto, é devido questionar: se a grossa maioria das pessoas não realizou esse tipo de sonho ao longo da história, mas sobreviveu normalmente, ele é de fato essencial?
Por ventura, ao desconhecer-se, o homem não se deixa levar por impressões externas e toma para si os sonhos que nada ou pouco lhe dizem respeito, acreditando lhe pertencerem legitimamente? Na falta de tal consciência, recorre-se, inconscientemente, ao sonho alheio? Curiosamente, pode-se pensar em pesadelo coletivo quando muitos se enganam e sofrem por motivos semelhantes? Querer um estilo de vida (por mais atraente que seja) fora dos moldes particulares pode causar algum desarranjo psíquico tal como o desgastante desvio das energias que devem sustentar a imagem do sonho que em algum momento não fará mais tanto sentido e perderá a sustentação outrora convicta? A frustração pode roubar a cena conforme o grau de desalinhamento entre o que perdeu o significado e a realidade construída?
É aqui, portanto, que se deve empreender uma profunda e intensa autoavaliação a fim de reduzir o equívoco, mesmo sob o enorme trabalho que se seguirá por força da mudança que se impõe cada vez mais vigorosa conforme se avança na aquisição da libertadora consciência. Porém, quem quer se libertar da própria inconsciência? O que você quer para si: sonho ou pesadelo social?


*Armando Correa de Siqueira Neto é psicólogo, diretor da Self Consultoria em Gestão de Pessoas. Coautor dos livros Gigantes da Motivação, Gigantes da Liderança e Educação 2006 -