quarta-feira, 20 de abril de 2011

Somos se temos palco

Nei Alberto Pies

O mundo inteiro é um palco, e todos os homens e mulheres são apenas atores” (William Shakespeare, 1564-1616)

A vida em sociedade é o nosso grande palco. Neste palco, somos permanentemente observados por aquilo que somos, aquilo que fazemos e aquilo que representamos diante dos demais pares. Em grande medida, o conjunto destas observações nos é apresentado cotidianamente pelos outros e, assim, vamos internalizando, assimilando e construindo o nosso modo de ser, pensar e agir. Há que se observar, de nossa parte, certo grau de coerência para que possamos inspirar confiança e constância nas relações que estabelecemos com os demais.
Nem sempre sabemos precisar o quanto o olhar e a observação dos outros pesa sobre a vida da gente. É fato, no entanto, que maior parte de nossas condutas e reações regem-se a partir destes, em nome do reconhecimento social. A qualidade de nossa vida social está intrinsecamente ligada com a nossa capacidade de conviver, de associar-se, de mover-se, de construir acordos e projetos coletivos, de agregar.
A nossa construção de seres sociais é feita a partir de nossas experiências individuais e coletivas. Os aprendizados são sempre pessoais, mas a tendência é a sociedade padronizar nossos modos de ser, de pensar e de agir. Marta Medeiros, em suas recentes crônicas, traz presente a preocupação de como resolver o conjunto de dualidades que reside em cada um de nós, uma vez que a sociedade tende a nos “encaixotar” e “selar uma etiqueta” para nos definir. Assim escreve: “É obrigatório confirmar o que o seu rótulo induz a pensarem sobre você”. Como podemos observar, nem sempre temos as melhores oportunidades para nos alçarmos à condição de sujeitos: livres, autônomos, autênticos.
Outro fator determinante da qualidade de nossa vida social é procurar sempre agir sob “justa medida”. A “justa medida” estabelece-se a partir dos nossos méritos e métodos. Nem sempre basta ter bons méritos para agir, se não tivermos um método adequado para nos fazer compreender. Da mesma forma, pouco vale um método se não temos boas razões para nos comunicar/expressar. Sempre há que se equacionar os métodos com os nossos méritos (e vice-versa).
Somos permanentemente tentados a enquadrar e rotular as ações e posturas dos outros sem antes pensarmos na complexidade da vida humana. A experiência de vida pessoal, embora fundante, é insuficiente para explicar o conjunto de ações, reações e comportamento dos outros. A vida de cada ser humana carrega nuances próprias, únicas e insubstituíveis. Daí reside nossa dificuldade de educar os outros, de opinar sobre suas atitudes, de construir consciência, de dar conselhos.
O fato de sermos únicos e genuínos é maravilhoso, mas também assustador. Por isso, nada melhor do que investir nas inúmeras oportunidades para conhecer os outros, relacionando-se com eles. O nosso palco é o mesmo, mas jamais serão iguais as nossas buscas para nos fazermos gente. Todos, felizmente, temos o desafio de nos tornarmos seres sociais, mas não podemos abdicar de nossas peculiaridades e experiências únicas, interiores e pessoais.

Nei Alberto Pies, professor e ativista de direitos humanos

8 comentários:

  1. Parabéns,

    Sou educadora freiriana e vibrei muito ao ler esse belo texto tão humano.

    Lucinêde - Itabuna/Bahia

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  2. há mistérios que melhor não conhecer...Há pessoas que melhor não rotular, por que elas, assim como eu,nasceram para perde-se no emaranhado de ilusões que homens constantemente criam para auto-justificar-se. Cada qual sabe da dor de ser o que é, e sabe mesmo sem saber que a vida é luta, é claro que todos vão lhe apontar.E óbvio que todos tem direito a defesa.

    "A filosofia hoje me auxilia a viver indiferente assim,nesta solidão sem fim" (chico Buarque).

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  3. Gostei muito nessa vida somos um palco onde somos observados e observamos os outros para podermos tirar uma definição da pessoa que nos rodeam.
    Neste palco eu convido você ser justo e determinado no seu julgamento onde estamos em manchete de primeira página com olhares de vários angulos engaiolando mensagens oras positivas ,ora negativas .
    mas é este palco que vivo e presencio então é nele que devo apreciar com cuidado.
    Parabéns

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  4. Este texto é um espelho norteador em que ajuda o homem na formação de sua personalidade ética e vivências com o outro. Percebe-se neste palco as coisas que estão aí representadas de forma geral e para cada índividuo, só que cada um tem uma forma de vê tais coisas formando assim o seu jeito de está no mundo. Daí o cuidado que o homem deve ter em seus julgamentos referente ao outro. Porque este é constituido de dois mundos, ou seja, o mundo interior e exterior. Portanto, o texto ajuda bastante nos pré-julgamento que o próprio homem constantemente faz uns com os outros.

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  5. "Ser livre é viver numa gaiola de ouro!" Não lembro onde li essa frase mas, traduz exatamente o que apreendi.
    Ninguém gosta de estar numa gaiola, mesmo que seja de ouro...
    Para não ser rotulado, estamos sempre tentando ser "iguais" (vejamos o exemplo da moda: todo mundo igual para não ser alvo de comentários -Maldosos, lógico!
    Uma das grandes lições da filosofia é aprender a ir além das aparências, buscar a essência.
    Como é dito no filme matrix: dê sempre uma segunda olhada, minunciosa.
    Mas paga-se um preço alto quando não se é igual: o rótulo. O pré-julgamento, o pré-juízo

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  6. Esse texto é muito bom! Gostei pq as vezes achamos q que podemos modular uma pessoa, mas essa pessoa n aceita ser modulada, rotulada. Somos seres insubstituivéis no palco da vida cada um tem um jeito de pensar, sentir e agir. Devemos tentar entender o outro assim como ele ou ela é.
    Amei, está de parabéns!!!

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  7. Gostei, por ser uma abordagem simples à Inteligência Emocional e publicarei amanhã no meu blogue, se não houver oposição entretanto.
    Obrigado

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  8. Somos representado ao outro de tudo que nos é exterior, portanto há o cuidado no tipo de representação que estamos inseridos, ainda assim, aquele que nos decodifica como tal, está propenso a se equivocar, uma vez que cada indivíduo tem uma forma de vê as caisas que lhes são apresentada. Assim, falando de minhas peculiaridades, não me incomodo na inserção deste palco cheio de visões pré-julgadas.

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