quinta-feira, 11 de agosto de 2011

A ofensiva dos historiadores


Jéferson Dantas1

A materialidade do ofício dos historiadores são as fontes (periódicos, revistas, relatórios, iconografias, atas, cartografias, etc.) e, a partir delas, a investigação sócio-histórica se adensa e se complexifica de acordo com as ferramentas metodológicas provenientes de sua episteme. No que tange ao conhecimento histórico escolarizado, a pesquisa acadêmica oferece importantes subsídios para os professores da Educação Básica repensarem as suas práticas pedagógicas ou mesmo adotarem livros didáticos sintonizados com a reflexão permanente e o gosto pela pesquisa.

Contudo, os historiadores – profissão ainda não reconhecida/regulamentada pelo Congresso Nacional – estão impossibilitados de exercerem o seu ofício, principalmente aqueles que lidam com a história recente do país. Documentos relacionados à tortura durante o período ditatorial no Brasil (1964-1985) encontram-se indisponíveis, justamente, para os/as profissionais que mais necessitam destas fontes para a condução de suas investigações científicas. Países como Argentina e Chile têm prestado contas do seu passado histórico recente, não apenas para trazer à tona as chagas da Ditadura, mas para que as novas gerações conheçam e lutem por uma sociedade desprovida da lógica persecutória e de atentados à vida e à dignidade humanas. 
 
O ex-ministro da Defesa, Nelson Jobim, foi omisso ou incapaz de interceder junto às Forças Armadas a abertura dos documentos relacionados ao período ditatorial. Fica-nos a impressão de que não é importante remexer nas feridas do passado, protelando-se ou condenando ao esquecimento o que, efetivamente, não pode ser esquecido. Os historiadores lidam, essencialmente, com três categorias centrais: o tempo, o espaço e a memória. Na conjugação destas três categorias estrutura-se a ‘narrativa histórica’, delimitada temporalmente e dependente das fontes disponíveis. O Estado brasileiro, todavia, tem negado aos historiadores o direito da pesquisa, embora a Comissão de Direitos Humanos e Minorias no Congresso Nacional tenha aprovado a criação da Comissão Nacional da Verdade, que objetiva o esclarecimento da violação dos direitos humanos durante o regime militar.

A Lei da Anistia de 1979, uma excrescência jurídica que igualou torturadores e torturados, tentou apagar definitivamente qualquer possibilidade de dissenso. Entretanto, a História existe para continuarmos lembrando daquilo que insistentemente os variados veículos de manipulação insistem em menosprezar e destruir. Clio, portanto, manter-se-á insone e vigilante!

1 Historiador e Doutorando em Educação (UFSC). Secretário-Geral da ANPUH (Associação Nacional dos Professores de História) Seção Santa Catarina. E-mail: clioinsone@gmail.com.

Um comentário:

  1. Olá professor Jéferson,sou acadêmico de História da UFMS, em Campo Grande.
    Sua reflexão é de grande importância, algo que vez em quando é debatido em sala de aula. Acredito que enquanto pessoas que viveram, ou melhor, que atuaram como torturadores ou nos mandos de tal ato estiverem vivas, não haverá abertura aos documentos. Será um processo e luta de "longa duração".

    Daniel Oliveira.

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