Corina de Mello Decco
Pedagoga, psicopedagoga, terapeuta de família e psicanalista – moradora do Rio de Janeiro
Segundo a Teoria da Interpretação de Sonhos elaborada por Freud, o desejo é o que move o aparelho psíquico, é o que nos faz dormir, sonhar e acordar. E o sonho em sua representação onírica é a manifestação de um desejo. Um desejo inconsciente. Entretanto, o desejo que Freud nomeia é enigmático e difere da forma absoluta designada da necessidade - da falta – mas que deve ser compreendido e apreciado como elemento de uma pulsão que permeia o limite entre a vida e a morte – entre o ensinar e o aprender.
Na visão psicanalítica, o desejo, não se trata simplesmente de algo a ser realizado, mas de uma falta nunca realizada pelos seres finitos e imperfeitos – o sujeito. O sujeito que ensina e o sujeito que aprende.
Para Lacan, o desejo, em sua função, é inconsciente. O desejo é o desejo do desejo, isto é, o desejo do Outro, porque o sujeito é um ser faltante e se constitui através do Outro e pode levar uma vida inteira procurando a plena realização, uma vez que, o sujeito, não satisfaz um desejo, mas goza por desejar.
E, segundo o pensamento filosófico, quando consciente, o desejo é uma atitude mental que acompanha a resposta do fim esperado e, assim, Hegel, define o desejo como algo imparável que está sempre em movimento e, Sócrates, em sua imensurável sabedoria, afirma que todo homem, por natureza, tem o desejo de aprender e por esse processo evolui.
Piaget, na estruturação da epistemologia genética postula que o conhecimento se dá na relação entre o sujeito e o objeto a ser conhecido e, também, Ruben Alves, numa postura educadora, filosófica e psicanalítica declara que, “o conhecimento são extensões do corpo para a realização do desejo” e, um desejo realizado é como um pensamento morto, mas que pode ressuscitar numa nova roupagem e originar outro desejo e, assim, sucessivamente.
Contudo, o formato e o conceito psicanalítico de ‘transferência’ na relação professor/aluno pode auxiliar na compreensão de como o desejo se faz presente no processo de ensinar e de aprender no que diz respeito ao desenvolvimento cognitivo.
Partindo deste pressuposto, a importância do desejo no processo de ensinar e de aprender passa pelas bases do pensamento filosófico (uma vez que, o desejo é considerado uma atitude mental) e pela matriz do pensamento psicanalítico que aponta para uma pulsão que origina-se na estrutura do princípio do prazer.
O desejo de ensinar de um indivíduo constitui-se no entrelaçamento do objeto de prazer, de poder e de domínio do conhecimento que, segundo Lacan, busca ocupar o lugar do “sujeito suposto-saber”, comumente conhecido por ‘professor/analista’. Embora, o ensinar não está diretamente ligado somente à figura do professor, mas a todos aqueles que têm o desejo de ensinar, de transmitir o conhecimento adquirido e, com isso, beneficiar a vida de outras pessoas e, este ato, é facilitado quando ocorre a transferência, ou seja, quando o aprendente ‘apaixona-se’ pelo ensinante.
E, nesta mesma linha de pensamento ‘apaixonado’, o desejo de aprender, também, emerge da constituição psíquica do sujeito sedenta por conhecimento. E, este conhecimento transita pelos corredores dos mais simples para os mais complexos, dos mais rudimentares para os mais elaborados, dos empíricos para os acadêmicos e científicos. E nesta caminhada, o processo de aprendizagem, fundamentado no desejo de aprender, eclode.
Entretanto, quando o aprender sistematizado é apresentado ao sujeito como obrigação e destituído de desejo, ele apenas germina, mas não floresce, não frutifica - estagna. Embora, o sujeito nunca para de aprender, a vida, enquanto durar é um constante processo de aprendizagem.
Portanto, quer seja aprendendo, quer seja ensinando, sejamos repletos de desejos, porque o desejo é o que nos move, é o que nos faz sonhar, realizar e novamente desejar.
E o meu desejo, hoje, é que possamos ser professores e professoras desejantes.
quinta-feira, 19 de janeiro de 2012
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Muito bom, já estou te seguindo! Parabens!
ResponderExcluirÉ uma pena que em nossa sociedade, muitas vezes, seja por necessidade ou por sacrifícios, aprendemos a não desejar, quer dizer, não desejar os nossos próprios desejos e sim partilhar dos desejos da maioria, seria isto saudável? Legal, se enquanto professores, pais, amigos, sujeitos construíssemos espaço suficiente para que “todos” desejem, e que o desejo de todos fosse saciado?
ResponderExcluirNa escola, isto é uma força tarefa, seres desejam o tempo todo e tudo seguindo uma ordem, que nem sempre é a ordem que desejamos, às vezes é imposta (imposição não negativa), e sim no sentido de já estar pronta, acabada, não sabemos se queríamos ou não essas formas e acontecem mais apropriações, adaptações, e não desejos, criações. É claro podemos compartilhar dos desejos dos outros desejantes e também buscar espaço ou até mesmo impor espaço para desejarmos.
De fato, desejar apenas não basta, desejo é como liberdade, liberdade e desejo brigam por espaço, acho que aprender e ensinar tem dessas coisas, essa luta entre poder desejar e ter a liberdade para isto. Nada de muito novo para a psicanálise.
Desejei comentar.
O desejo é a mola propulsora para o fazer. Para isso, o desejo deve ser vibrante e apaixonado em cada um de nós. É a partir desse movimento de paixão/desejo/ação, é que construimos e inovamos. Mônica.
ResponderExcluir