sexta-feira, 23 de agosto de 2013

O processo de socialização da Educação a distância no Brasil



Prof. Jackislandy Meira de M. Silva

Pelo texto “Ensaio sobre a Educação a Distância no Brasil” da autora Maria Luiza Belloni no tocante aos Processos de Socialização podemos perceber que é uma tentativa clara e aberta de preparar os jovens indivíduos das novas gerações para o uso dos meios técnicos disponíveis na sociedade. Ora, é cada vez mais comum em nossa sociedade a utilização, mesmo banalizada é claro, dos instrumentos tecnológicos para fins de comunicação e interação social. Já é quase impensável viver em sociedade sem um celular ou um computador plugados à internet. A mediação de máquinas em nossas relações é quase uma necessidade de sobrevivência. É muito notório em nosso meio o uso das máquinas para se relacionar. Sendo assim, é oportuna a observação feita no Ensaio, do ponto de vista da sociologia, “que não há mais como constestar que as diferentes mídias eletrônicas assumem um papel cada vez mais importante no processo de socialização”(BELLONI, Maria Luiza. Ensaio Sobre a Educação a Distância no Brasil in Educação & Sociedade, ano XXIII, nº 78, Abril/2002, p. 118).
A partir disso, como negligenciar a evidência desses recursos técnicos tão presentes na sociedade vigente? De um lado, as crianças aprendendo sozinhas porque já possuem afinidade com essas novas teconologias, pois convivem em casa com esse tipo de máquina; escolas particulares equipando ou aparelhando suas instituições com máquinas de última geração, sem pessoal eficaz e capaz para operá-las. Por outro lado, temos as escolas públicas que tentam acelerar os passos lentos no processo de informatização de suas instituições. O pessoal dos Governos Municipal, Estadual e Federal abarrotando as escolas públicas de computadores, data show e outros recursos não oferece, na mesma medida, o acompanhamento de uma capacitação para coordenadores pedagógicos e professores. Falta gerenciamento e muita boa vontade. O resultado disso é que nossas escolas estão, algumas, diga-se de passagem, repletas de aparelhos multimídia, laboratórios de infomática e etc, inutilizados, porque o acelerado processo de midiatização ou informatização das escolas pelo poder público não tem um acompanhamento de capacitação de pessoal considerado.
Tenho a impressão de que, por causa disso, há um sério contraponto nas escolas entre o avanço teconológico muito imediato e o retrocesso dos profissionais da educação que não acompanham este avanço. Daí surge a pergunta que não quer calar: Por que a mesma intimidade que os nossos filhos tem com as máquinas em casa não pode haver nas escolas? Ou por que eles não são educados a usá-los de forma adequada na escola? As escolas públicas deveriam se importar um pouco mais com essa problemática e já ir inserindo mecanismos metodológicos, como a internet, para quebrar um pouco mais o ranço tradicional dos sistemas de ensino. A crítica que a autora faz em relação às escolas públicas e sua interação com as TIC procede: “as crianças aprendem sozinhas (autodidaxia), lidando com máquinas 'inteligentes' e 'interativas', conteúdos, formas e normas que a instituição escolar, despreparada, mal equipada e desprestigiada, nem sempre aprova e raramente desenvolve”(idem).
Com esse panorama, que não é negativo, mas processual e conflitivo, ousamos justificar pelo chamado choque de gerações por que passamos hoje. O mundo não é o mesmo de há 20 anos. Estamos passando por transformações profundas na economia, na moral, na educação, nas relações sociais, enfim. Por incrível que pareça, as TIC interferem em todas as áreas de conhecimento muito mais hoje do que no passado. Os meios tecnológicos de informação e comunicação não tinham grande influência na vida das sociedades, - bastam lembrar da queda das ditaduras de Honduras e Egito, o quanto a sociedade civil do mundo inteiro não participou via internet, influenciando diretamente na queda desses ditadores - tampouco no processo de socialização entre os próprios indivíduos. A TV e o rádio foram ampliados pela presença da internet em grande parte dos lares brasileiros – Conversamos com as vítimas via internet, em tempo real, no momento do Tsunami e terremoto que varreu o nordeste do Japão no passado. O mais impressionante é não só absorvermos informação, mas interagirmos com ela. Intervirmos na comunicação, interferirmos na velocidade da informação.
A meu ver, o problema funda-se aí, na constatação de que não basta copiar ou repetir informações ou multiplicá-las até, mas cogitá-las, reformando e interiorizando todo e qualquer tipo de conteúdo veiculado, dependendo da reflexão crítica, intuitiva, e da criatividade do usuário. Nesse ponto justamente entra o papel maravilhoso da educação presencial e à distância.
Ao invés de negligenciar os recursos técnicos como bem fazem as escolas e academias públicas, devíamos tentar inserir os meios mais sofisticados da tecnologia mundial a serviço das escolas, bem como de uma grande parte da população ainda excluída do acesso ao mundo virtual que presta os mais variados serviços às pessoas, desde a emissão de contracheque, compras até cursos de bom nível educacional.
É óbvio que não dá para ficarmos fora de todos os recursos tecnológicos à nossa disposição. Isso é praticamente impensável, mas cuidemos, como bem demonstra o Ensaio, de não entrarmos no jogo capitalista de consumo exacerbado dos bens tecnológicos, porque isso pode nos anestesiar frente às profundas desigualdades sociais que nos cercam e nos envolvem. Mesmo com todo avanço da ciência e da técnica, o mundo ainda não está livre da fome, da miséria, da pobreza, das doenças, da corrupção. Paira sobre nós ainda um grande atraso cultural e político. É preciso alertar: “Nos países subdesenvolvidos porém industrializados e altamente urbanizados; pobres e atrasados cultural e politicamente, mas com 'bolsões tecnificados' e globalizados; nesses países as contradições e as desigualdades sociais tendem a ser agravadas pelo avanço tecnológico”(idem, p. 119).
Certamente, como nos afirma a autora do Ensaio, na contramão do capitalismo e do neoliberalismo selvagem, eis que surge a entrada da EaD como promotora de uma educação mais econômica e de qualidade, “(...) no qual o uso intensivo das TIC se combina com as técnicas de gestão e marketing, gerando formas inéditas de ensino que podem até resultar, às vezes e com sorte, em efetiva aprendizagem”(idem, p. 121).

Prof. Jackislandy Meira de M. Silva - Bacharel em Teologia, Licenciado em Filosofia e Especialização em Metafísica - www.umasreflexoes.blogspot.com

sexta-feira, 16 de agosto de 2013

Uma prova para os professores



Profª. Irene Reis dos Santos
“Se você tem uma mente calma, será uma pessoa bela.
Se você é uma pessoa bela, criará um lar harmonioso.
Se o seu lar está em harmonia, sua nação se encontrará em ordem.
Se em sua nação há ordem, haverá paz no mundo.”  Lao Tsé

Se bem compreendida a profundidade das palavras de Lao Tsé[1], é possível começar a empreender verdadeiras mudanças na Educação. Pensemos: quanto do tempo escolar é destinado atualmente ao desenvolvimento humano?
            Somos testemunhas impotentes de atentados protagonizados, em muitas ocasiões, por pessoas com formação acadêmica, o que incita em nós espanto e perplexidade. Os veículos de comunicação expõem cotidianamente feitos de criminosos que parecem não valorizar suas vidas, menos ainda a alheia. Matam de maneira atroz e ainda nos perguntamos retoricamente: por quê?
E para esta resposta que não se delineia concretamente somam-se muitas outras, para muitas indagações que povoam nossa mente: que padrão de beleza estamos criando?; até quando exaltaremos a beleza construída nas academias, nas clínicas de estética, expostas em desfiles de moda, a beleza exterior, enfim, sem observar de fato como está o interior de cada indivíduo que nos cerca?
No mundo corporativo sempre se culpa a Instituição pela permanência de ultrapassados modelos, como se ela fosse um ser abstratamente personificado, a quem possa ser imposto um julgamento. Talvez, confortavelmente, ignore-se que quando um indivíduo é diferente ou muda, promove a diferença e as mudanças, desde que não se amolde antes ao velho. Foi isto que se perguntou a antropóloga Margaret Mead[2]:  “Quem disse que um pequeno grupo de pessoas comprometidas não pode mudar o mundo?”
As pessoas têm sonhos, objetivos pessoais? Como vão em busca deles? Quais são os modelos sociais de sucesso que os jovens vão escolher imitar? Em que circunstâncias a escola os ajuda nessa escolha? Os professores têm tempo (frente a todos os conteúdos elencados no planejamento) para perguntar aos alunos quais são seus ídolos, quais são seus modelos? Qual é para o aluno, o sentido da vida?
Sabe-se, por meio de ensinamentos do mundo publicitário que, uma ação individual leva a um comportamento contagiante. Por que, então, ainda não se investe fortemente em mudança de comportamento? Por que, nas escolas, continuamos tendo como base fórmulas tão antigas quanto entediantes? A quem convém que perdure este estado de coisas?
O sociólogo Jonathan Crane[3] propõe a ideia de que há um ponto chave na sociedade que deve ser observado e estudado de maneira crítica e atenciosa. Segundo ele, quando a quantidade de pessoas que servem como modelos sociais fica abaixo de 5%, a comunidade torna-se disfuncional, como demonstram os aumentos dos índices de gravidez na adolescência, abandono escolar, envolvimento com drogas e violência. Por outro lado, se o número de pessoas que servem como modelos (comerciantes, professores, gerentes) está entre 5% e 40%, as comunidades mantêm-se estáveis e funcionais.
 Entre os jovens, quem hoje ousa sonhar em ser professor em países como Brasil ou Argentina? Do que mais precisamos para chegar à conclusão de que, salvo poucas exceções, vivemos em uma sociedade disfuncional? Coragem tem quem, diante de tal realidade, ainda procria, contrariando a ideia machadiana: “não tive filhos, não transmiti a nenhuma criatura o legado da nossa miséria.[4]
Apesar do esforço deste e de alguns em não transmitir nem perpetuar a miséria humana, outros o fazem e aí está nosso mundo com muitas crianças a serem formadas, conduzidas, preparadas. Assim, aos educadores não há alternativas senão facilitar seu desenvolvimento saudável, torná-las autônomas e capazes de trilhar seus próprios caminhos, respeitando o de outros.
Mas urge começar por um desenvolvimento pessoal, um investimento individual, reinventando-se, mudando e se transformando em um modelo social positivo e belo, digno de ser imitado.
Se, além de refletir, a proposta aqui fosse também responder as perguntas para nota de uma prova final, muitos de nós – educadores – já estaríamos reprovados e carregaríamos o peso do fracasso escolar. E, ainda que não valha nota, podemos nos livrar da sensação de fracasso se não mudarmos nada?
Profª. Irene Reis dos Santos
LETRAS PORTUGUÊS/ ESPAÑOL - USP
Professora, tradutora, autora, revisora, leitora crítica.


- Lao tze, Laozi, Lao-tse ou Lao Tzu são pronúncias ocidentalizadas para o título do misterioso personagem da filosofia antiga chinesa, cujo nome real seria Li Er ou Lao Dan.
[2] Margaret Mead foi uma antropóloga cultural norte-americana. Nasceu na Pensilvânia, criada na localidade de Doylestown por um pai professor universitário e uma mãe ativista social. 
[3] Jonathan Cranesociólogo da Universidade de Illinois
[4] Memórias Póstumas de Brás Cubas é um romance escrito por Machado de Assis, desenvolvido em princípio como folhetim, de março a dezembro de 1880, na Revista Brasileira, para, no ano seguinte, ser publicado como livro, pela então Tipografia Nacional.

quinta-feira, 8 de agosto de 2013

De uma rede em construção



"Criamos a época da velocidade, mas nos sentimos enclausurados dentro
dela. Nossos conhecimentos fizeram-nos céticos; nossa inteligência,
empedernidos e cruéis”. (Charles Chaplin)

        Parece que a palavra da moda se chama rede. Com o desgaste do uso de outras palavras, até a educação passará pelo crivo da rede, o que pode ajudar na atualização e afirmação do papel que a escola deve assumir para dar conta de sua função social. A questão está na própria compreensão de rede, uma vez que a mesma não existe sem os nós (amarrações) próprios que a constituem como tal.
Educar sempre foi e sempre será uma arte, adaptada aos diferentes momentos históricos. (Uma arte nunca está pronta e também não tem fórmula única para existir). Educar faz parte de um processo dinâmico da vida da sociedade. Educar sempre trouxe desafios imensos, sobretudo em momentos históricos de profundas transformações tecnológicas e de organização da produção e da sobrevivência. Educar, para uma mudança social, exige sempre a definição de sonhos e metas, concretizadas por grandes ideias, pois “quem conduz e arrasta o mundo não são as máquinas, mas as ideias” (Vitor Hugo).
A escola, no nosso tempo histórico, cumpre a função insubstituível de sistematização das informações, para transformá-las em conhecimento. É verdade que os alunos de hoje leem mais e que estão mais informados e integrados aos processos dinâmicos da vida social, mas também é verdade que escrevem menos, tem dificuldades de se comunicar e expressar, tem grandes problemas nos seus relacionamentos interpessoais, tem dificuldades de projetar seus sonhos e idealizar o seu futuro. Os adolescentes e jovens de hoje não conseguem, ainda, transformar a avalanche de informações que recebem em conhecimento, posturas e atitudes. Estar informado e conectado ao mundo virtual não é suficiente para decidir o que fazer com o mundo real, seja a partir de uma intervenção pessoal ou coletiva.
Vivemos a era da tecnologia e da informatização, mas não quer dizer que possamos suprimir a importância da oralidade e da escrita. Mais do que nunca, para a nossa humanização, precisamos comunicar e compreender melhor a nós mesmos e aos outros. Precisamos aperfeiçoar a nossa comunicação, para uma melhor compreensão de nós mesmos, dos outros e do mundo. Precisamos tornar as máquinas ferramentas que nos auxiliem na convivência social. Os “faces” não podem substituir as nossas “faces a faces”, respeitando as diferenças e as peculiaridades do ser que somos. Precisamos também produzir os nossos conhecimentos através da escrita, fazendo sínteses que nos orientem para uma vida alicerçada nos sonhos e metas que decidimos projetar.
Uma rede de ensino precisa articular os diferentes “nós” que a constituem: a comunidade, os alunos, os professores, a comunidade escolar, os gestores municipais, os conselhos de educação. A mediação entre estes diferentes “nós” precisa contemplar as condições para uma boa aprendizagem e a vivência de cidadania e de direitos das nossas crianças, adolescentes e jovens a partir das nossas escolas.
            O esforço do conjunto de escolas municipais ou estaduais e seus gestores constituem uma rede em construção. Esta rede, no entanto, não pode trabalhar isolada. Outras redes precisam ser articuladas e amarradas para que a vida social esteja garantida. A escola não pode nem ser uma ilha e nem uma rede isolada do contexto social da qual ela é parte.
Nei Alberto Pies, professor e ativista de direitos humanos.

quinta-feira, 1 de agosto de 2013

Meio e fim



Armando Correa de Siqueira Neto*
A razão confere ao ser humano a capacidade de escolha frente às possibilidades que a vida oferece. Porquanto o homem pode optar ao invés de se submeter, se assim lhe interessar. Por tal condição, ele avançou aos estágios tecnológicos tão apreciáveis atualmente, além de estimular a sua continuidade indo em direção ao que a imaginação e a realização permitirem no futuro. Então, do ponto de vista da preservação da espécie e do aperfeiçoamento, fins estabelecidos o inspiraram na jornada evolutiva. E, para atingir cada fim pretendido, demandou-se a criação dos respectivos meios. Mas ocorreu uma séria incompreensão, levando-o a trocar o fim pelo meio. Mais: a troca revestiu-se de verdade inquestionável e absoluta. Diz-se, sem pestanejar: “É assim mesmo!” Medo de eventual revisão?
Com o desenvolvimento da sociedade, novos interesses ganharam espaço na vida comum, incluindo-se, notadamente, a posição social que tantos aspiram atingir. A partir dessa perspectiva, os meios que deveriam servir para se alcançar a sobrevivência, mesclaram-se com o status quo, e, em vários casos, resultou o exagero. Por exemplo, a moradia (meio) para a proteção (fim) pessoal e familiar, tornou-se a finalidade em si mesma, haja vista muitas pessoas se predisporem mais a conquistá-la para a satisfação das aparências sociais do que propriamente para a sua segurança – ainda que não se perceba -, pois as dimensões arquitetônicas e os padrões de luxo servem, consideravelmente, de modo estatisticamente comprovado, para atrair o perigo do roubo e, nos casos extremos, da morte.
Entretanto, o autoengano faz o seu autor alegar que só se quer maior conforto e segurança, e que, infelizmente, alguns assim não o permitem. Porém, equivale dizer que há efeito sem causa. Reação sem ação. É prudente lembrar que quem pretende chamar a atenção da sociedade para a sua abundância, atrai não apenas àquele do seu interesse, mas a outros cujo objetivo é perigosamente distinto... Ainda: verifica-se que mesmo que a troca do fim pelo meio salte aos olhos, a cegueira causada pela autoilusão impede de se observar criticamente tal equívoco, e faz, ainda, concluir-se, de forma imperativa, que morar modestamente é pouco, e que a riqueza simboliza inteligência superior. Será mesmo?
Portanto, ao invés de tentar reduzir as chances de sofrer os perigos através da ponderação e da modéstia, age-se contrariamente à lógica da segurança, erguendo enorme chamariz por meio da irrefletida necessidade da opulência. Não se aprecia sequer que houve uma alteração do fim pelo meio, e que a simples sobrevivência foi engolida pela complexa dimensão da aparência e da satisfação acerca da localização na pirâmide social. Não é arriscado demais?
É claro que há lugares ao redor do mundo onde a segurança se mostra melhor instalada. Não obstante, inexiste a garantia de que se perpetue tal proteção, pois o descuido é filho da acomodação, e somos sempre tentados a tal relaxamento. E mesmo nos casos em que aparentemente a segurança encontra-se em alta, a realidade impõe-se inexorável. Logo, emerge uma pergunta: Nas atuais condições sociais, não se anda na contramão do bom senso ao mostrar grandeza (e gastar com ela) e se expor tão abertamente?

*Armando Correa de Siqueira Neto é psicólogo (CRP 06/69637), diretor da Self Consultoria em Gestão de Pessoas, palestrante, professor e mestre em Liderança pela Unisa Business School. Coautor dos livros Gigantes da Motivação, Gigantes da Liderança e Educação 2006. E-mail: selfcursos@uol.com.br