Denilson Aparecido Rossi
No presente artigo pretendemos apresentar, em forma de diálogo, uma
reflexão sobre a filosofia e o bebê. A conversa ocorrerá entre
dois personagens, “philos” e “sophia”. Inicialmente, o
intento destes personagens, será dialogar em torno de algumas
considerações gerais sobre a filosofia e o bebê. Depois, será
enfocar a questão antes da concepção, durante a gestação e após
o nascimento do bebê.
1. Considerações
Gerais sobre a Filosofia e o Bebê
Philos – Bom dia
Sabedoria!
Sophia – Bom dia
Amigo!
Philos –
Muito se escuta dizer que filosofia é coisa inútil, é coisa de
louco. Diz-se ainda que a filosofia “é a ciência com a qual, ou
sem a qual, o mundo continua tal qual”. Do outro lado se escuta
dizer também que filosofia é algo muito polido, de difícil acesso
e que somente algumas mentes demasiadamente superiores podem
praticar. Você concorda com isso Sophia?
Sophia –
Evidentemente que não. A filosofia é sempre mais do que se pode
dizer e/ou imaginar. Filosofia é uma palavra de origem grega:
philosophia. Philos, em grego, significa amigo e Sophia, significa
sabedoria.
Philos – Ah! Sê
entendi bem, filosofia significa então, amigo da sabedoria?
Sophia –
Isso mesmo! A filosofia se ocupa com o saber, com o conhecimento. O
filósofo busca sempre saber mais... conhecer mais...
Philos – Como fazer
para saber e/ou conhecer mais?
Sophia –
Para tanto, a filosofia possui uma ferramenta, um método próprio.
Trata-se de trilhar os caminhos da razão. A filosofia é a arte do
pensar, indagar, querer saber o “por quê” das coisas. Filosofar
é, portanto, buscar conhecer mais do que uma determinada coisa e/ou
situação aparenta ser. Trata-se de buscar compreender de forma
consciente e crítica as razões de ser e de viver no mundo. Longe de
ser algo estéril ou inacessível a filosofia é o instrumento que
nos possibilita a compreensão do sentido das coisas. A filosofia
está diretamente relacionada ao cotidiano das pessoas. Sobre isso,
Luckesi e Passos acrescentam dizendo que “a filosofia tem por
objeto de reflexão os sentidos, os significados e os valores que
dimensionam e norteiam a vida e prática histórica humana”1.
Pode-se dizer, portanto, que viver sem filosofar é vegetar, é
não-viver.
O homem em busca de
sentido.
Pensar, indagar,
buscar conhecer,
A própria razão de
ser,
O que significa viver.
Isso é filosofia.
O que significa viver.
Isso é filosofia.
É sabedoria.
Os anos passam
ligeiro.
Os fatos se sucedem.
O tempo inteiro,
Muitas coisas
acontecem.
Mas, qual o sentido
de ser?
Dos anos, dos fatos,
do tempo, das coisas?
Perguntar o por quê?
Isso é filosofia,
É saber.
Philos – Se a filosofia está diretamente relacionada ao cotidiano
das pessoas significa que ela também tem algo a ver com o bebê?
Sophia – Perfeitamente! O bebê é mais que um novo fato na
história da humanidade. O bebê constitui-se num novo ser que
interpela por si mesmo uma razão de viver. Portanto, a idéia e o
surgimento de cada bebê é uma nova possibilidade para se filosofar,
isto é, um sentido para a vida buscar. O bebê traz consigo muitas
interrogações. Muitas são as perguntas que surgem antes da
concepção. Outras tantas que emergem durante a gravidez. Outras
mais que são suscitadas depois do nascimento. Indubitavelmente são
inumeráveis as indagações... o que, de certo modo, demonstra
existir uma relação direta da filosofia com o bebê.
2. A Filosofia e o
Bebê antes da Concepção
Philos – Olá
Sabedoria! Gostaria que soubesses o quão significativo me tem sido
nosso diálogo.
Sophia –
Que bom saber Amigo! Saibas que estou sempre aberta a dialogar. Muito
me agrada o diálogo, pois, ele é a possibilidade de expressar o já
compreendido bem como buscar compreender o que ainda se pode
expressar.
Diálogo.
A arte de compreender
O que muito se deseja saber.
Aproxima o
conhecimento distante
Possibilita
visualizar um novo horizonte.
O estranho passa a
ser conhecido
O obscuro torna-se
esclarecido.
Essencial é
dialogar,
Todo dia.
Isso é filosofar,
É sabedoria.
Philos –
Mas, de fato, o que a filosofia tem mesmo a ver com o bebê antes da
concepção?
Sophia –
Pois bem, se compreendemos a filosofia como o exercício do pensar, a
prática dos por quês e a busca do sentido, facilmente entenderemos
que ela tem tudo a ver com a questão do bebê antes da concepção.
Antes que um bebê seja concebido é possível que muitas perguntas
sejam elaboradas, dependendo do contexto em que se dará a concepção.
Philos –
Como assim, dependendo do contexto? E, quais são as perguntas mais
comuns?
Sophia –
Veja bem Amigo! São vários os contextos que precedem uma concepção:
um contexto seria a situação de um casal, casados, que muito se
amam e muito desejam ter um filho e planejam concebê-lo; outro seria
a situação de um casal, ainda não casados, mas que muito se amam e
desejam ter um filho; outro contexto pode ser o caso de uma mulher
que deseja ser mãe e pensa em conceber um filho de modo
independente; outro seria o caso do homem que deseja ser pai, mas que
não pretende se casar; outro ainda seria o contexto de pessoas que
desejam conceber filhos gêmeos; um contexto muito peculiar também
seria no caso de um dos cônjuges possuir determinada doença, no
entanto, desejarem ter filhos; e, assim por diante...
É
notório que cada contexto suscite indagações próprias.
Imaginemos, por exemplo, o contexto em que o casal, casados, que
muito se amam e muito desejam ter um filho, planejam concebê-lo.
Seria natural, neste caso, como conseqüência do pensar (filosofar),
fazerem-se perguntas tais como: Será que já é o momento certo de
termos um filho? Como será esse filho? Queremos homem ou mulher?
Pretendemos que seja, ou não, gêmeos? Quando vai nascer? O que
queremos com esse filho? E, outras tantas mais...
Pensemos
em um outro contexto: uma mulher que deseja ter um filho de modo
independente. Neste caso, ela poderia se perguntar: Será que tenho o
direito de conceber um filho de modo independente? Ou, por que eu não
posso gerar um filho, sozinha? Será que essa criança vai se
desenvolver bem sem a presença do pai? Qual o melhor caminho para
conceber um filho de modo independente? Vou procurar um banco de
espermas e fazer uma inseminação? Vou procurar um homem que se
disponha a colaborar comigo? Será que, depois, o pai não vai me
tirar o filho? ...
Dentre
essas, outras perguntas se poderia fazer de acordo com cada contexto.
Independente da situação é importante ressaltar que,
paradoxalmente, as indagações criam conflito e, ao mesmo tempo,
abrem caminhos, descortinam novos horizontes. O que, portanto,
constitui-se num processo filosófico. Razão pela qual podemos dizer
que antes mesmo da concepção o bebê já nos faz filosofar.
3. A Filosofia e o
Bebê durante a Gestação
Philos –
Prezada Sabedoria! Pode a filosofia interferir na vida de um bebê
durante a gestação?
Sophia –
E como pode Amigo! Mas antes de analisar a interferência da
filosofia na vida do bebê, faz-se necessário compreender como
pressuposto o que se entende por ser humano, considerando que o bebê
já é, em potência e ato, um ser humano. Para tanto, podemos
utilizar o conceito cunhado pelo filósofo brasileiro Henrique L.
Vaz, para quem “o ser humano é constituído por estruturas (corpo,
psique, espírito) e por relações (mundo, outro, absoluto)”.
Philos –
Por primeiro, falas-me então da relação da filosofia e o bebê a
partir da estrutura (corpo, psique, espírito) do ser humano.
Sophia –
Pois bem! É natural que os pais, assim que recebam a notícia de que
estão grávidos se ponham imediatamente a filosofar, isto é, a
pensar e a fazerem-se muitas perguntas, tais como: Será que o
coração dele já está batendo? Como pode desenvolver-se o corpo de
um bebê dentro do útero da mãe? Que tamanho já tem nosso bebê?
Será que seu corpo já está todo definido e é perfeito? Que
cuidados precisamos ter na alimentação para não prejudicar a sua
formação? Fumar e ingerir bebidas alcoólicas, que tipos de males
causam no bebê?
O que se sabe é que até o terceiro mês, principalmente, qualquer
coisa pode ser fatal para o bebê. E que durante toda a gestação o
bebê é nutrido pela mãe. Portanto, o desenvolvimento do feto, em
termos de corpo, depende diretamente do que e de como a mãe se
nutre. São inúmeras as questões que se prestam em torno do
desenvolvimento do corpo do ser humano ainda no ventre materno.
Em se
tratando da psique não é diferente. Desde a concepção até o
nascimento trata-se de um longo percurso no qual a mãe experimenta
diferentes situações emocionais.
Faz-se necessário interrogar-se: nesse período, tudo o que se passa
na psique da mãe não pode ser absorvido pelo filho? Quando a mãe
está feliz será que o bebê também se sente feliz? Quando a mãe
está triste o bebê se sente triste? Quando a mãe sente raiva,
medo, insegurança, angústia, dor e outros tantos sentimentos de
desconforto o bebê também os sente?
Por outro lado, quando a mãe sente paz, coragem, segurança,
harmonia e outros sentimentos de conforto, o bebê também os sente?
Os sentimentos ou estado emocional do pai também influenciam no
bebê? Se o pai ou a mãe rejeitar o bebê que tipo de influência
psicológica isso exercerá no filho? A questão da projeção de
desejo com relação ao sexo pode interferir na psique do bebê? Se
os pais desejarem muito uma menina e vir um menino, ou o contrário,
como ficará a psique dessa criatura? Até aonde atinge a psique do
bebê o que se passa na psique dos pais?
No que se refere ao espírito é considerável perguntar quando é
mesmo que começa a vida? Qual é o momento e como o espírito da
vida é insuflado no ser humano? De onde provém esse espírito? Que
força de espírito tem o bebê já no ventre materno? Durante o
período gestacional pode evoluir o espírito do ser humano?
Perguntar,
É desejo de saber,
É buscar conhecer,
É filosofar.
Philos – Muito bem Sabedoria! Mas, como fora me dito antes, além
da dimensão estrutural o humano se caracteriza também como um ser
de relações (mundo, outro, absoluto). Podes-me dizer mais sobre
isso?
Sophia –
Sim Amigo! Antes, porém, quero ressaltar que seu nobre desejo de
muito saber e buscar conhecer é a razão pela qual me faz responder.
De fato, o ser humano é um ser de múltiplas relações. Relações
estas que se dão com o outro, com o cosmo, com o absoluto e,
seguramente, consigo mesmo.
Pensando
no bebê, durante a gestação, vale interrogar: as relações que os
pais exercem com consigo mesmo, com o outro, com o mundo e com o
absoluto até que ponto influencia o filho? Tudo o que a gestante
escuta, vê e imagina pode ser escutado, visualizado e imaginado pelo
bebê? Os pais podem ensinar o bebê a se relacionar com as pessoas,
com o mundo e com o absoluto de modo respeitoso e amoroso, mesmo o
filho ainda estando no ventre? E assim por diante...
Ser de
relação
O homem
é sem igual.
Relacionar-se é sua condição
Relacionar-se é sua condição
De ser
como tal.
Além
das questões acima abordadas com relação à filosofia e o bebê,
durante a gestação, nota-se ainda a necessidade de considerar
outras mais: quando o nosso filho vai nascer? Será que os resultados
e previsões constatados nos exames de ecografia (ou ultra-som) são
verdadeiros? Até que ponto os exames não falham? Como ele vai
nascer? Nosso bebê vai nascer de parto natural ou será preciso
fazer cesariana? Vai se parecer com o pai ou com a mãe, ou ainda,
com os dois? Qual será a cor dos seus olhos? Vai nascer com saúde?
Mais... ???
A
cada pergunta um tempo desprendido para se pensar, com isto,
percebe-se, portanto, que há um exercício constante: o filosofar.
Filosofia
e bebê
Antes
de nascer.
Tudo a
ver.
4. A Filosofia e o
Bebê após o nascimento
Sophia –
Prezado Amigo! Com o nascimento do bebê dá-se o encontro com um
novo ser humano e, conseqüentemente, com muitas respostas para as
inúmeras perguntas até então elaboradas em torno desse ser.
Sobretudo, em torno do corpo, muitas respostas são encontradas.
Agora, já se sabe se o corpo é perfeito, com quem se parece, se é
homem ou mulher, o tamanho, e outras mais... Todavia, surgem outras
perguntas de acordo com cada situação.
Philos –
Como assim, outras perguntas? Por quê, de acordo com cada situação?
Sophia –
Isso mesmo! Uma é a situação na qual o bebê nasce perfeito. Outra
quando o bebê nasce com alguma necessidade especial. Outra ainda
quando nascem gêmeos, trigêmeos... E, podem ocorrer outras
situações...
Philos – No caso do
bebê nascer perfeito, por quê fazer perguntas?
Sophia –
Porque viver é filosofar. A vida por si só se encarrega de novas
questões apresentar.
O tempo passou ligeiro
O tempo passou ligeiro
O bebê acaba de
nascer.
Por primeiro,
O que fazer?
Como esta há outras questões a serem elaboradas: pode um ser humano
ser perfeito? O que se entende por perfeito? Ser perfeito significa
ter todos os membros e órgãos?
Ah! O bebê está chorando, por quê? Está com fome? Está com dor?
O que fazer? O leite materno será suficiente para o bebê nutrir-se
saudavelmente? Será preciso medicá-lo? É necessário estabelecer
rotina (horário de mamar, de banho, de dormir, etc.) ou é cedo para
preocupar-se com isso? Onde encontrar respostas para estas e outras
tantas perguntas relacionadas às necessidades básicas? Será que os
pais têm as respostas? Será que as respostas estão com o filho? Ou
ainda, as respostas podem estar na relação entre os pais e o bebê?
No que tange à afetividade e sociabilidade é conveniente
interrogar-se também: o que é importante fazer para que o bebê
seja uma pessoa integrada afetivamente? O que fazer para que ele se
desenvolva e seja sociável? O modo como os pais lidam com seus
sentimentos e emoções, até que ponto interfere na afetividade do
filho? O comportamento dos adultos influencia muito no processo de
socialização deste novo ser humano? Como fazer o melhor para que o
bebê cresça feliz e seja amável? Como será o futuro do bebê?
Philos – Estimada Sabedoria! Considerando o que me fora dito acima
tenho a impressão que em torno do bebê, além das interrogações
apresentadas, existe uma infinidade de outros questionamentos. Isso
procede?
Sophia – Indubitavelmente, sua impressão procede caro Amigo! Como
vimos, muitas são as perguntas que se prestam em torno do bebê,
seja antes da concepção, durante a gestação, bem como depois do
nascimento. Disto decorre nossa compreensão de que o bebê nos faz
filosofar necessariamente. As interrogações são importantes para
descortinar novos horizontes. A bem da verdade há que se dizer ainda
que a profundidade das indagações é proporcional à importância
que se dá ao bebê.
O bebê.
Quem ele é?
Um novo ser?
O que a filosofia,
Com ele tem a ver?
Vale a pena pensar
Com ousadia.
Isso é filosofar,
É sabedoria.
1
LUCKESI, Cipriano Carlos; PASSOS, Elizete Silva. Introdução à
Filosofia: aprendendo a pensar. 5. ed. São Paulo: Cortez, 2004, p.
87.
Muito interessante a ligação entre concepção, nascimento e o filosofar
ResponderExcluirA ideia é justamente inserir o processo do filosofar na totalidade da existência humana, a começar desde os primeiros passos do nosso existir.
ResponderExcluirDenilson.