sexta-feira, 27 de julho de 2012

O custo da indiferença


“Quando é verdadeira, quando nasce da necessidade de dizer, a voz humana não encontra quem a detenha... Porque todos, todos, temos algo a dizer aos outros, alguma coisa, alguma palavra que merece ser celebrada ou perdoada pelos demais”. (Eduardo Galeano, Livro dos Abraços, LPM)

            O controle social das políticas públicas e sobre atos políticos e administrativos ainda é um passo a ser dado para o aperfeiçoamento da democracia. Em tempos de avançadas tecnologias, os portais de transparência são uma tímida tentativa de tornar transparente a forma como o dinheiro público é destinado e aplicado. Disponibilizar informações sobre as estruturas públicas não é suficiente para superar a apatia e o descrédito da população na política. Somente com instrumentos de participação direta nas decisões sobre as políticas e investimentos apontaremos para uma democracia participativa, superando os problemas e vícios da democracia representativa.
            Quem dentre nós, sinceramente, ainda tem tesão para participar e envolver-se na política atual? Por que a política nos distanciou tanto da vida cotidiana, das necessidades de nossa gente? Por que em nossas escolas tememos falar de política, mesmo que educação nunca seja neutra?
Dos servidores públicos, efetivos ou de confiança dos políticos eleitos, a comunidade não espera que somente “batam ponto”. A comunidade espera que também despertem da apatia, prestando serviços e assistência que promovam a cidadania.  Não serve a ninguém tanta decepção e descrença na política se é justamente ela que decide sobre a nossa qualidade de vida e nossa cidadania.
O fenômeno da apatia política não é recente não. No ano de 1917, num pequeno texto, Os indiferentes, Antonio Gramsci descreve que a indiferença “é abulia, é parasitismo, é covardia, não é vida”. E complementa dizendo que “não podem existir os apenas homens, os estranhos à cidade. Quem verdadeiramente vive não pode deixar de ser cidadão e partidário.O que acontece não acontece tanto porque alguns o queiram, mas porque a massa dos homens abdica de sua vontade, deixa fazer, deixa enrolarem os nós que, depois, só a espada poderá cortar; deixa promulgar leis que, depois, só a revolta pode anular; deixa subir ao poder homens que, depois, só uma sublevação poderá derrubar”.
Como cidadãos modernos e apáticos, transformamos democracia em ritual: o voto. A cada dois anos, somos consultados nas urnas sobre o rumo que os nossos governantes dão ao nosso município, ao nosso estado ou ao nosso país. Dissemos, então, se queremos que os rumos da política mudem ou permaneçam como estão. Mas de qual política? Da política do bem-comum ou a política dos interesses da classe política?
Muitos já se cansaram de participar assim, esporadicamente. Cansaram, também, de assistir a teatros e encenações dos políticos pela televisão. Cansaram de ouvir discussões inócuas e oportunistas da situação ou da oposição. E não são oposição nem situação, são cidadãos e cidadãs, desejosos de participação.
Esta tal indiferença é um fardo que não precisamos carregar. A democracia que queremos deve estar alicerçada no controle social, no debate democrático, no respeito aos direitos humanos e na liberdade de cada um organizar e reclamar as suas demandas de cidadania. Será esta democracia moderna demais?

Nei Alberto Pies, professor e ativista em direitos humanos.

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